Essência

Despencou na face o sorriso que já era flácido. Sem dentes e sem motivos para que segurar o riso frouxo?

Morreu mais um pouco da parca alegria; ela não gosta de risos plásticos tampouco da hipocrisia.

Desistiu da esperança, de abrir as portas e só o vazio por elas penetrar.

Ninguém percebeu como definhava, passando imperceptível entre a multidão atenta aos seus próprios umbigos.

Só tinha o chão gasto para rastejar seus passos rotos, só tinha um céu infinito que não podia alcançar.

O medo que aterra seu olhos inundados deita e acorda lembrando o pequeno João Hélio, os becos, as pontes, a miséria, as oportunidades escorrendo pelos vãos dos dedos.

De que vale ter um dia inteiro pra ser lembrada se dentro da sua casa ela não tem espaço?

De que adianta ser homenageada aos quatro ventos se o seu dia a dia não muda, o trabalho desigual, a sórdida competição, o mundo às suas costas e cacos no chão.

Um dia de glamour para as mulheres bonitas e de destaque, não para àquela que não tem domingos nem feriados, mas que sabe o valor de cada gota de suor.

Não se ilude mais, não recebe abraços e francamente nem se lembra de que tem um dia para comemorar o fato de ser mulher. A vida para ela é tão dura que até para receber uma homenagem ela não se sente merecedora.

Dia dos homens para vender, para aparecer na mídia, não para conceder à ela direitos aos quais ela sempre fez jus.

Não é um dia no ano que vai apagar sorriso murcho daquela que perdeu o filho de forma violenta, daquela que não é respeitada nos outros 364 dias do ano, é um dia para ela sim refletir e ela própria se dar o valor, se fazer respeitada e aceita exatamente como ela é; negra, branca, amarela, feia, bonita, rude ou refinada, sem fazer comparação com a mulher produto do out door.

Ambas mulheres em lugares diferentes, com papéis diferentes mas com valores iguais, pois cada uma está no lugar que merece ou escolheu estar.

Um abraço à todas as guerreiras, de todas as raças!