MEU PAI ME SALVOU DE UMA BALA PERDIDA.

Nos idos dos anos 80 o barato para passar o tempo, eram os livros de bolso, eram chamados “Livro de bolso” pois cabia na medida nos bolsos das calças Jeans muitas vezes as velhas e boas UsTop. Era acessório obrigatório de muitos jovens e meio adultos.

O tema destes livretos eram histórias de Faroeste tipo bang-bang, os personagens do velho oeste deixavam os leitores, mas que ligados nos episódios e duelos.

Tive um amigo que trabalhávamos no mesmo setor e que nunca mais o vi desde que, na época, saiu da empresa; este camarada tinha quase que uma biblioteca destes livrinhos de bolso, sempre que estávamos em um intervalo ou na parada de ônibus, lá ele estava lendo sua literatura obrigatória.

Até que um dia resolvi lhe pedir emprestado um daqueles livros, gostaria de começar a leitura daqueles contos. Ele me pediu que aguardasse até o outro dia pois iria me emprestar o livro que estava lendo, pois terminaria a leitura naquela noite. No outro dia como combinado ele trouxe o livro e me entregou, ao colocar no bolso lhe disse:

- Esse será o livro que dará origem a série!

Já estava no terceiro dia lendo o livro e sempre o lia à noite antes de dormir, ainda não havia adquirido o habito de andar com ele no bolso, pois no bolso pra mim até a carteira incomodava; sempre que estava lendo ficava tão concentrado na história, que muitas das vezes tinha que me esquivar para não ser atingido pelas balas perdidas dos duelos entre mocinhos e bandidos.

Talvez iria terminar de ler no terceiro dia, mas, eis que a porta do quarto se abre e seu Valdemar entra; e ao me ver com o livrinho me perguntou o que estava lendo; eu então tentei lhe explicar de que se trata aquele livro e disse-lhe:

- Estou lendo um livro que é na verdade um passatempo, com estórias igual aqueles filmes de bang-bang que passam na TV.

Meu pai sempre leu com dificuldade e escreveu meio arrastado, apesar de possuir uma caligrafia legível, sempre acreditei

que ele estava a um nivel alguns passos acima de uma pessoa semianalfabeto e alguns centímetros abaixo de um alfabetizado, mas tinha conhecimento de que se tratava aquele livreto. Acho que deveria ter ouvido alguém falar, ou leu algumas páginas e logo tirou a conclusão de que aquele tipo de livro nada contribuía para o aprendizado ou assimilação de algo que pudesse melhorar os conhecimentos de alguma pessoa.

Ele me pediu o livro e pela capa já tirou a dúvida que realmente se tratava daqueles livrinhos que já tinha conhecimento de seu teor literário. Me devolveu e disse:

- Meu filho, vou lhe pedir uma coisa e espero que você me obedeça, se daqui pra frente você não fizer nada do que eu lhe mandar fazer, mas, fizer o que vou lhe pedir agora, já fico contente.

Não imaginava o que iria me pedir, pediu novamente o livro e disse:

- Nunca mais leia este tipo de livro, estes livrinhos não te ensinam nada, você só perde seu tempo, isso é uma leitura sem futuro.

Me devolveu novamente o livro e saiu do quarto sem falar mais nada e em silencio.

Fiquei pensando e tirei a conclusão que tinha razão, guardei o livro e devolvi para o meu amigo, que prontamente me ofereceu outros; tive de inventar uma estória e disse a ele que estava todo enrolado com algumas matérias na escola e precisava me dedicar mas. Tenho certeza que ele nunca acreditou nessa justificativa, mas gosto cada qual tem o seu.

Meu pai queimou literalmente meu livro, e sempre que assistia os seriados de James West, Chaparral ou os filmes de John Wayne e Trinity com Bud Spenser e Terence Hill e outros do gênero me fazia lembrar daquele filme de bolso que não terminei de ler.

Elton Portela
Enviado por Elton Portela em 01/02/2021
Reeditado em 17/07/2023
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