TEMORES &+

TEMORES I

Chegou um campônio na delegacia,

com o braço na tipóia e engessado.

Pediu logo para falar com o delegado

que estava bem disposto nesse dia

e já lhe foi indagando o que queria.

"Seu doutor, eu fui atropelado,

é por isso que meu braço está quebrado."

E o registro da ocorrência até existia.

Depois que a parte, de ponta a ponta, leu,

respondeu, com paciência, o delegado:

"Sinto muito, o problema não é meu,

você vai ter de contratar um advogado,

nem sei porque me procurou, também:

aqui diz que o senhor estava bem..."

TEMORES II

"Seu delegado, é que foi uma viatura

da polícia, a que me atropelou..."

"Eu já sei, a ocorrência registrou,

mas não consta daqui qualquer fratura."

"Vou-lhe contar a minha verdade pura,"

falou o campônio e logo relatou:

"É que essa viatura me atirou,

pra longe do cavalo, em pedra dura.

Eu fui rolando pela ribanceira

e meu cavalo rolou para o outro lado,

pobre do bicho, ficou todo quebrado!..."

O delegado foi até a terceira

página do depoimento registrado.

"Ah, está aqui, um cavalo atropelado..."

TEMORES III

"Mas, e daí? A parte diz também

que o senhor ficou completamente ileso,

que até saiu andando, muito teso,

não quis carona, afirmou que estava bem..."

"Pois é, doutor, é que o polícia vem

para o meu lado, largando todo o peso

em cada passo, pra ver se eu tava leso,

mas um revólver na mão ainda tem...

Aí me disse que tinha sacrificado

o meu cavalo, por estar quebrado:

três tiros tinha dado na montada...

Quando falou se eu tava machucado,

o senhor vê, respondi meio assustado:

Não, seu guarda, tô bom, não tenho nada!..."

OBLÓQUIO [ruído na comunicação]

(para Claudiomar Barcellos)

Era um casal de velhinhos. Todo dia

a esposa passava o miolo do pão

para o marido e na casca, sem paixão,

punha manteiga e logo então comia.

Certa manhã, sem saber o que fazia,

ela estendeu a casca, com a mão,

para o marido, com tão meiga expressão,

que, de imediato, o velho já engolia...

Lambeu os beiços e lhe agradeceu...

"Que bom, querida, há anos que eu queria

comer a casca, para meu consolo..."

Essa notícia à senhora surpreendeu:

"Mas eu comia a casca e não sabia!...

Logo eu, que sempre quis comer miolo..."

RÁDIO-PATRULHA

Um cara viu que arrombavam a sua casa;

para a polícia telefonou com pressa:

"É um assalto, venham bem depressa!..."

"Não temos gente e não temos viatura..."

Então o fulano, numa mentira, arrasa:

"É que eu matei os dois, a coisa é essa!

Estou com dois defuntos nesta peça,

mas a parada foi bastante dura..."

Veio a polícia, quase imediatamente

e prenderam em flagrante dois ladrões.

"Você não disse que tinha morto os dois?"

"E você não disse que não tinha gente?

Pois eu disse que matei os bandidões

e a viatura apareceu logo depois..."