Quem não DANÇA embala a CRIANÇA

No quintal há duas cadelas e uma galinha. Que louvável, elas nunca estão sozinhas. As duas cadelas e uma galinha. As duas cadelas latem: “au...au...au”. A galinha, embora velha e perdendo a barbela, está aprendendo a cacarejar: “co...co...ro... co...có”, diante dessa deficiência, toca a vida sozinha.

A galinha é magricela e anda o dia inteiro. Quando cansa, em cima de uma das pernas-varetas, descansa. Seu corpo contém penas, para esconder a magreza, porque a comida é escassa e dela, os seus donos não tem pena. Que pena!

Uma das cadelas, chama-se Maristela. Pelancuda, mostrando os ossos da costela. As duas rondam o quintal a noite inteira, quando cansam, uma deita na rede e a outra balança. Balança em vai e vem...em vem e vai, revezando e trabalhando em conjunto, não exaure nenhuma delas, que são duas cadelas.

A galinha e as duas cadelas comem o que o patrão der. Para a galinha: bagos de milho e água. Para as cadelas: água, arroz e feijão pálido, sem macarrão. Esses são os pratos prediletos dos bichos de estimação do patrão...ão...ão...ão. Menu sem carne e macarrão.

Às vezes a galinha deita em cima das pernas-varetas. Fecha os olhos e medita. O que estaria pensando a galinha, naquela cela, sozinha? Uma das cadelas, que é a Maristela, sobe em cima do entulho e em silêncio profundo, observa. Desce e confidencia para sua amiga, Cidinha: “Subi em cima daquele monte de ervas secas e vi um mundo-imundo. Secar erva faz parte do projeto minerva, certo, amiguinha Cidinha?”

Quem colocou os nomes nas cadelas, poderia ter colocado nome na galinha. Será que foi por falta de criatividade ou má vontade. Assim como Maria Rosa, uma menina em tenra idade, ela ficaria contente em ser chamada de Nina. Nina, Nininha, nunca ouviu falar, mas é certeza que não aprovaria as brigas de galo em rinha, entendeu, patroa Mariinha!

As cadelas diferenciam os latidos: “au...au...au”, para os de casa e amigos. Latem raivosas: “auuu...auuu...auuu” avisando que chegou algum estranho, que pode representar o perigo. Em épocas de festas, disparam os seus corações. Bum...bum...bum...somem do terreiro com medo dos rojões. Correm para debaixo de qualquer coisa, até para debaixo do monte de ervas, fugindo das explosões.

A galinha Nina desafia o perigo. Não tem medo do barulho dos rojões e mora um metro e meio acima do piso do terreiro. Lugar pequeno para ela, pois seus parentes gozam de espaço amplo com terra úmida, macia e enfestadas de minhocas, árvores para dormir, que de janeiro a janeiro, usam como poleiro, livrando-as das muriçocas, que vem aos enxames, das tabocas.

As cadelas Cidinha e Maristela uivam em noite de lua cheia. Por que será que elas, as duas cadelas, uivam em noite de lua cheia, se não é noite de santa ceia? Querem saudar as estrelas, cumprimentar a lua ou espantar os sapos, que em noite de lua cheia, nos jardins, vagueiam; procurando dejetos, besouros e insetos para comerem quietos?

A galinha não conhece a luz do sol e os pingos da chuva, isso porque, não necessita deles para viver. Come, bebe e dorme sem nada pagar. Para ela, boa vida é andar de cá para lá, de lá para cá, respirar e ficar de papo para ar. Com o pescoço para o ar, beber e comer sem nada pagar, isentando-a de ter que ciscar.

A vida desses três bichos parece piada. Piada de galinha incinerada, que nada! Levam a vida na manha, a galinha Nina e as cadelas Maristela e Cidinha. Mas de uma coisa todos padecem: limitam-se, diante da limitação da vida. As duas cadelas não namoram, mas pelo menos falam a mesma língua; agora Nina, a galinha que vive sozinha, além de não ter amizades, nunca saberá se existem galos com sua idade.

Isso as cadelas são testemunhas e confirmam de verdade; é ou não é, patrão e patroa Mariinha? Eles formam o casal, dono de duas cadelas e uma galinha, que vive sozinha. É ou não é, cadela Cidinha?

Mutável Gambiarreiro
Enviado por Mutável Gambiarreiro em 18/06/2015
Reeditado em 24/06/2015
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