O BONECO DE GENGIBRE (&+)

O boneco de gengibre

Folclore dos estados unidos, recontado e versificado por william lagos, 27/9/2018

O Boneco de Gengibre (XII) – 27 set 2018

Pedinte à Porta (III)) – 28 set 2018

A Ronda dos “Ses” (IV) – 29 set 2018

Progredindo para o Nada (III) – 30 set 2018

Amputação Burral (III) – 1º out 2018

O BONECO DE GENGIBRE I

Era uma vez uma velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininhoI

E aconteceu que a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho

Começou a se sentir muito sozinha...

Foi procurar de receitas um livrinho

Que tinha sido de sua avó bruxinha

E ali acabou encontrando receitinha

Para fazer um garotinho ou garotinha

Com uma massa de pão de gengibrinho,

Que seria quase igual a um menininho

Ou a uma menininha bem vivinha!

Ela amassou de farinha um bocadinho,

Misturando com açúcar e leitinho,

De uma raiz de gengibre cortou um pedacinho,

Picou bastante e deixou bem moidinho,

Pegou fermento e misturou tudo juntinho!...

O BONECO DE GENGIBRE II

Ora, acontece que a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho,

Seguiu perfeitamente a receitinha,

Mas não lembrou de fazer o encantinho.

Contudo, preparou a sua massinha,

De gengibre, leite, açúcar e farinha

E espalhou sobre a mesa da cozinha,

Deixou com o rolo de massa bem lisinha

E depois foi pegar uma faquinha.

E foi cortando beiradinha a beiradinha,

Até formar um perfeito retratinho

De um boneco todo marronzinho,

Não sei se garotinho ou garotinha,

Mas devia ficar bastante gostosinho

E com o gengibre, um tanto ardidozinho!...

O BONECO DE GENGIBRE III

Depois disso, a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho.

Foi fazer de chocolate uma pastinha

E colocou um pouco sobre o bonequinho.

Assim deixou bem bonito um casaquinho,

Mas com creme de leite bem branquinho

Foi colocando cada botãozinho

Desde a gola e por toda a beiradinha

E depois disso, fabricou um chapeuzinho,

De açúcar-cândi com corante laranjinha

Que colocou sobre a sua cabecinha.

E a seguir, foi buscar numa latinha.

Açúcar mascavo, que é mais pretinho

E fez primeiro um bonito sapatinho

E depois outro, para não ficar sozinho

E pôs os dois nos pés do bonequinho.

Logo a seguir, desenhou um narizinho

Com fio de chocolate marronzinho

E pôs corante bem encarnadinho

Em um pouco de nata de leitinho

E de um lado, ela aplicou um olhinho,

Depois o outro, para não ficar sozinho!...

O BONECO DE GENGIBRE IV

E depois disso, a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho,

Passou o corante em mais açucarzinho

E acrescentou uma boquinha rosadinha.

Chegou então o velhinho pequeninho,

Batendo palmas para a velhinha pequeninha:

“Parabéns! Vai ficar bem gostosinho!”

“Não, senhor!” – disse a velhinha pequeninha,

Tapando a boca do velhinho pequeninho:

“Este aqui vai ser nosso filhinho!”

“Eu preferia que fosse uma filhinha!

Podias ter botado um vestidinho...”

“Não, senhor! Eu quero é um garotinho!

Fui eu que fiz e não pedi seu conselhinho!”

“É que menina fica em casa mais quietinha...”

“Não interessa! Vá calando a sua boquinha!”

O velhinho pequeninho ficou bem caladinho

E a velhinha pequeninha pôs na panela o bonequinho,

Junto com um pouco de banha de porquinho;

Ela acendeu com cuidado o seu forninho

E esperou que cozinhasse o garotinho

Que ela queria que virasse o seu filhinho!

O BONECO DE GENGIBRE V

Mas se esqueceu a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho,

Que precisava de dizer um encantinho,

Que serviria para prender o bonequinho

Depois que fosse sair do seu forninho

E se pudesse levantar da panelinha

Para a velhinha não sentir-se mais sozinha!

Mas quando ela foi abrir o seu forninho

E com um guardanapo puxou a panelinha

E retirou com cuidado a sua tampinha,

Bem ligeiro se levantou o Bonequinho

E saltou fora com um rápido pulinho,

Diretamente no chão de sua cozinha!

Quando a velhinha quis pegar o Bonequinho,

Dizendo: “Que bom! Agora tenho o meu filhinho!”

Ele correu depressa até a portinha:

“Nã-nã-nã-não! Quero ser bem livrezinho!”

E correu para o pátio ligeirinho!

Logo a seguir já estava no caminho!

O BONECO DE GENGIBRE VI

E depois disso, a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho,

Saiu correndo atrás do Bonequinho

E o velhinho pequeninho correu atrás do Bonequinho,

Mas a velhinha era velha e pequeninha

E o velhinho era velho e pequeninho

E o boneco corria muito ligeirinho,

Logo deixando para trás o casalzinho!

A velhinha pequeninha soltou um suspirinho,

O velhinho pequeninho também já cansadinho,

O Boneco de Gengibre correndo ligeirinho,

Sumiu depressa ao longo do caminho!

E então falou o velhinho pequeninho,

Repreendendo a velhinha pequeninha:

“Eu te falei para fazer uma garotinha,

Ela ficava aqui em casa bem quietinha!”

Porém o espertalhão do Bonequinho

Corria feliz ao longo do caminho,

“Eu sou pequeno, mas muito levezinho!

Que bom que eu nasci bem ligeirinho,

Agora eu sou perfeitamente livrezinho,

Não sou filhinho da velhinha pequeninha,

Nem garotinho do velhinho pequeninho!

O BONECO DE GENGIBRE VII

E o tempo todo ele dava risadinha

E ia cantando a sua musiquinha:

“Corre, corre, velhinha pequeninha!

Corre, corre, velhinho pequeninho!

Que eu corro sempre bem mais depressinha,

Ninguém me pega, nem me dá pegadinha:

Porque eu sou de Gengibre o Bonequinho!”

Assim correu até ficar sozinho

E no caminho encontrou uma vaquinha:

“Ai, que lindo, de gengibre um Bonequinho!

Chega aqui perto, meu belo garotinho,

Tu me pareces ser muito gostozinho,

Deixa eu te dar só uma mordidinha!”

O Bonequinho deu outra risadinha

E então cantou a sua musiquinha:

“Eu me escapei da velhinha pequeninha

Corri mais depressa que o velhinho pequeninho!

Corre, corre, atrás de mim, vaca bobinha

Que eu corro sempre bem mais depressinha,

Ninguém me pega, nem me dá pegadinha:

Porque eu sou de Gengibre o Bonequinho!”

E a vaquinha era muito pesadinha,

Logo parou depois da corridinha,

Não conseguiu pegar o Bonequinho!

O BONECO DE GENGIBRE VIII

Pois correu bem depressa o Bonequinho:

Era pequeno, mas muito levezinho...

Quando parou, encontrou um cavalinho:

“Ora, ora, mas que lindo Bonequinho!

Venha até a beirada da cerquinha,

Chegue pertinho e dê uma paradinha,

Você parece ser muito gostozinho,

Eu vou lhe dar só uma mordidinha!...”

Mas o Bonequinho deu outra risadinha

E de novo cantou a sua musiquinha:

“Eu me escapei da velhinha pequeninha

Corri mais depressa que o velhinho pequeninho!

Eu corri mais ligeiro que a vaquinha

Corre, corre, atrás de mim, seu cavalinho!

Que eu corro sempre bem mais depressinha,

Ninguém me pega, nem me dá pegadinha:

Porque eu sou de Gengibre o Bonequinho!”

E o cavalo correu atrás do Bonequinho,

Mas estava preso dentro da cerquinha,

Não conseguiu pegar o Bonequinho!

E assim correu bem depressa o Bonequinho:

Era pequeno, mas muito levezinho...

Quando parou, chegou numa fazendinha,

E ali achou dez lindas mocinhas

Colhendo milho muito depressinha:

“Chegue até aqui, meu lindo Bonequinho!

Chegue à beirada do nosso celeirinho,

Você parece ser muito gostozinho,

Queremos todas comer você inteirinho!...”

O BONECO DE GENGIBRE IX

O Bonequinho deu outra risadinha

E então cantou a sua musiquinha:

“Eu me escapei da velhinha pequeninha

Corri mais depressa que o velhinho pequeninho!

Eu corri mais ligeiro que a vaquinha

E mais veloz eu corri que o cavalinho!

Corram, corram, atrás de mim, belas mocinhas!

Que eu corro sempre bem mais depressinha,

Ninguém me pega, nem me dá pegadinha:

Porque eu sou de Gengibre o Bonequinho!”

Ele correu tão depressa que as mocinhas

Logo pararam com suas corridinhas

E retornaram para seu trabalhinho,

Junto à beirada de um vermelho celeirinho,

Sem conseguirem pegar o Bonequinho!

Porque correu bem depressa o Bonequinho:

Era pequeno, mas muito levezinho...

Quando parou, achou numa florestinha

Dez lenhadores com suas machadinhas,

Ocupados a cortar as arvorezinhas:

“Corre até aqui, ligeiro Bonequinho,

Tu pareces ser muito gostozinho

E nós queremos te comer todinho!”

Pois o Bonequinho deu outra risadinha

E então cantou outra vez sua musiquinha:

“Eu me escapei da velhinha pequeninha

Corri mais depressa que o velhinho pequeninho!

Eu corri mais ligeiro que a vaquinha

E mais veloz eu corri que o cavalinho!

Corri mais depressa que dez belas mocinhas!

Corram, corram, atrás de mim, lenhadorzinhos!

Que eu corro sempre bem mais depressinha,

Ninguém me pega, nem me dá pegadinha:

Porque eu sou de Gengibre o Bonequinho!”

E os lenhadores com suas machadinhas

Desistiram de dar suas corridinhas,

Sem conseguirem pegar o Bonequinho!

O BONECO DE GENGIBRE X

Porque corria bem depressa o Bonequinho:

Era pequeno, mas muito levezinho...

Quando parou, deu uma suspiradinha

E de repente, encontrou uma raposinha!

“Você também quer me comer, bobinha?

Ninguém corre mais que este Bonequinho!

Ele soltou mais uma risadinha

E de novo cantou sua musiquinha:

“Eu me escapei da velhinha pequeninha

Corri mais depressa que o velhinho pequeninho!

Eu corri mais ligeiro que a vaquinha

E mais veloz eu corri que o cavalinho!

Corri mais depressa que dez belas mocinhas!

Bem mais ligeiro que dez lenhadorzinhos!

Que eu corro sempre bem mais depressinha,

Ninguém me pega, nem me dá pegadinha:

Porque eu sou de Gengibre o Bonequinho!”

Mas a raposa só lambeu o focinho:

“Eu gosto mesmo é de caçar galinha!

Só como carne, você é bobo, Bonequinho!

Não me parece que seja gostozinho,

Não vou lhe dar nem uma lambidinha!

Ficou o boneco meio desapontadinho,

Mas continuou meio desconfiadinho...

Como a raposa vinha atrás, devagarinho,

Ele correu até chegar a um riozinho,

Que cortava pela metade o seu caminho

E a raposa o alcançou, no seu passinho!...

O Boneco de Gengibre deu uma espiadinha,

Ela chegou, lambendo o seu focinho:

“Você quer atravessar esse riozinho?

Já escuto gente a correr pelo caminho...”

O Bonequinho ficou meio assustadinho:

“Se eu correr rio acima, é apertadinho!

Se descer rio abaixo, é molhadinho!

Posso ficar todo desmanchadinho,

Mas como posso atravessar esse riozinho?

Que coisa triste para este Bonequinho!”

O BONECO DE GENGIBRE XI

“Ora, eu não vejo nenhum probleminha,”

Disse a raposa, bem tranquilazinha.

“Eu sei nadar bastante depressinha,

Você se agarra bem no meu rabinho!”

Assim o boneco aceitou o conselhinho:

Subiu no rabo daquela raposinha,

Que começou a atravessar logo o riozinho...

Mas quando estava a um metro da beirinha,

Ela virou para trás o seu focinho:

“Você pesa demais para este meu rabinho,

Vai cair e ficar todo molhadinho...

Se não quiser ficar desmanchadinho,

Venha subir para meu lombo depressinha!”

E o Bonequinho confiou na raposinha,

Que foi nadando cada vez mais ligeirinho,

Até chegar no meio do riozinho...

“Está ficando mais fundo, Bonequinho,

Logo a água vai chegar no meu lombinho!

Você vai ficar todo molhadinho

E depois vai ficar desmanchadinho!”

“Mas o que eu faço?” – disse o Bonequinho.

“Monte depressa no meu pescocinho,

Ali você ficará sempre sequinho,

Sem perigo de ficar desmanchadinho...”

E bem depressa obedeceu o Bonequinho...

Nadando em frente seguiu a raposinha,

Até chegar a três quartos do caminho...

O BONECO DE GENGIBRE XII

“O rio está ficando cada vez mais fundinho,

Respinga água no meu pescocinho,

Você já deve estar ficando molhadinho

E em seguida vai ficar desmanchadinho...”

“E o que é que eu faço?” – gemeu o Bonequinho.

“Passe depressa para minha cabecinha,

Ela fica sempre bem levantadinha

E ali você pode continuar sequinho...”

E o Bonequinho montou na cabecinha,

Mas a seguir, lhe falou a Raposinha:

“Está mais forte o curso do riozinho

E vai tapar até minha cabecinha!

Pule depressa para meu focinho!”

“Pois ali eu não fico molhadinho?”

Eu preciso respirar, não é, bobinho?

O meu focinho fica bem levantadinho...

E o Bonequinho passou para o focinho.

Seguiu depressa nadando a raposinha,

Até chegarem na outra margenzinha...

“Viu só? Você chegou todo sequinho!”

“Muito obrigado!” – falou o Bonequinho.

“Não há de quê!” – replicou a raposinha,

Mas assim que pôs os pés sobre a terrinha

Sacudiu para o alto o seu focinho!

O Bonequinho, sem querer, deu um pulinho

E a raposinha abriu a sua boquinha

E abocanhou pela metade o Bonequinho!

“Ai de mim, que fiquei tão pequeninho!”

“Não se preocupe...” – respondeu a raposinha.

Com outra dentada engoliu o Bonequinho,

Muito contente a lamber o seu focinho!

EPÍLOGO

Mas no outro dia, a velhinha pequeninha,

Casada com um velhinho pequeninho,

Que moravam numa casinha pequeninha

E não tinham nem filhinha nem filhinho,

Nenhum grande e nenhum pequenininho.

Fez de gengibre mais outra massinha

E se lembrou do conselho do velhinho:

“Desta vez, vou botar um vestidinho,

E vou fazer de Gengibre a Bonequinha,

Porque menina fica em casa mais quietinha...”

E foi assim que ela ganhou a sua filhinha!

PEDINTE À PORTA I – 28 SET 2018

“Se peço algo, me chamam de pidão,

mas sempre alguma coisa se consegue;

há quem reclame, também há quem negue,

mas se eu nada pedir, nada me dão.

“Em certas casas, mora até mau coração,

que bem diversa disposição persegue,

que só conselho a quem lhe pede legue,

pois nem sequer ao faminto estende a mão.

“Só me irá dizer: “Vá embora trabalhar!”

mas nestes tempos de tanto desemprego,

pedir de porta em porta é o meu trabalho!

“E quando peço, alguém sempre há de ajudar;

talvez seja muito pouco, isso não nego,

ganhar esmola não é mais que quebra-galho!”

PEDINTE À PORTA II

“O ideal seria me dessem algum emprego,

mas raramente isso se pode conseguir.

E o que farão se por acaso eu for pedir:

“Capino o pátio, seus canteiros rego...”

“Um pacote de alimento não lhe nego,

já dinheiro é mais difícil repartir,

não irá com droga ou cachaça dividir,

mais que comida, por isso tendo apego?”

Dá a quem te pede e não recuses

àquele que te pede que lhe emprestes

este é o conselho da Bíblia Sagrada.

Se por acaso só lhe dás o que não uses,

não é amor descartar tuas velhas vestes,

o que de fato não te custa quase nada!

PEDINTE À PORTA III

Mas quando teu dinheiro está escasso

e as duas pontas é difícil amarrar,

o próprio ato de com pouco se ajudar

na direção do amor percorre um passo.

O engraçado é que o melhor abraço

costuma vir de quem tem pouco para dar;

há muito rico que não quer compartilhar,

pois não espera da pobreza entrar no laço.

Mas o pobre, que já passou necessidade

e que sabe como é não se ter nada,

sempre possível nova hora atribulada,

talvez por isso mais demonstre caridade

e se algum dia ele ou ela precisar

bater em porta e outra gente lhe negar?

A RONDA DOS “SES” I – 29 SET 18

“Se eu tivesse!” – tanta gente pensa...

E se o “se” fosse um saco de feijão?

Ninguém de fome morreria na ocasião,

Porém um “se”, em geral, nada compensa.

E “se eu tivesse feito? – coisa densa

é remoer do passado a negação;

para o futuro resta apenas direção,

lamentar o teu passado é até ofensa,

não para Deus, nem para a sociedade,

mas uma injúria que fazes a ti mesmo,

pois de teus erros não aproveitaste nada!

Que reste apenas, dessa perdida idade,

qualquer lição que armazenaste a esmo,

como alicerce de uma hora ultrapassada!

A RONDA DOS “SES” II

“Ai, se eu tivesse nascido em outra parte!

Tenho certeza de que nasci em tempo errado,

pelos meus pais fui tão mal aquinhoado!

E se uma herança comigo alguém reparte?”

Porém a vida possui diversa arte,

o teu presente por ti foi trabalhado,

só por ti o teu futuro conquistado,

que nenhum dia dessa espera se descarte!

Pois se ficares pensando só no “se”,

dentro do “se” ficarás perpetuamente,

que nenhum desses “ses” jamais se vê,

se não souberes por tal “se” te esforçar,

de cada “se” arrancando mais um pouco,

pois só esperar pelo “se” é ideal de louco!

A RONDA DOS “SES” III

“Ah, se eu pudesse passar naquela prova,

um bom emprego para mim teria arranjado!

“Ai, se na mega-sena tivesse eu só ganhado!”

Porém um “se” o teu volante não renova!

Mas se um “se”, ao contrário, te comprova

que o teu procedimento foi errado,

o mesmo erro sem repetir dobrado,

“se” conseguires, servirá de boa nova!

O “se”, contudo, não é nenhum vilão,

só representa outra escolha pela frente,

podes ficar sentado a “se pensar”

ou “se aprender” uma nova profissão

e “se” souberes competir com outra gente,

sem ficar preso no “se”, podes ganhar!

A RONDA DOS “SES” IV

“Se parar o bicho pega,” diz ditado;

“Se correr, o bicho come”, é depressão.

Um dia, eu li na calçada a conclusão:

“Se unir, a gente vence!” – que pecado

gramatical! Confundir-se a conjunção

com o pronome reflexivo ali encontrado;

tudo seria bem menos complicado

se houvesse menos ignorância e desrazão!

Tenho certeza de que o autor desta sentença

até pensou estar sendo inteligente,

pois “se” não fosse dessa certeza crente,

“se não tivesse” ali deixando algo que pensa,

teria decerto “se jogado” para trás!

Melhor quem erra de quem nunca nada faz!

PROGREDINDO PARA O NADA I – 30 SET 2018

“De mamando a caducando

a gente vai se educando...”

“No princípio, todos gostam,

mas no fim, muitos desgostam!”

quase todo nenê sabe mamar,

este é um instinto que vem antes do berço;

quase toda a freirinha reza o terço,

mas para isso, precisa se educar!

ao ver o seio, o nenê vai procurar

o seu mamilo, de biquinho terso;

qualquer pessoa pode escrever verso,

para poesia escrever, tem de treinar!

riscar palavras no coitado do papel

qualquer criança faz com dois aninhos!

existe gente que é um patriota natural,

outros que aprendem sobre a Pátria no quartel,

do Hino Nacional honrar belos versinhos,

mas Patriotismo é aprendizado individual!

PROGREDINDO PARA O NADA II

uma criança aprenderá a caminhar

talvez somente pela observação,

mas se houver boa estimulação,

bem mais depressa conseguirá marchar;

uma criança aprenderá a falar,

imitando os adultos que ali estão,

não há um instinto de conversação,

seu aparelho fonador tem de treinar!

já maiorzinha, de brincar vai aprender,

mas no princípio, para qualquer brinquedo

será preciso um modelo observar,

não há um instinto para tal saber,

será preciso desvendar esse segredo,

que inicialmente só bem longe irá jogar!

PROGREDINDO PARA O NADA III

também aos poucos se aprende a trabalhar,

a pintar quadros, a fazer poesia;

só a ciência e a matemática saberia

depois de a elas bom estudo consagrar!

mas para que se aprender a caducar?

ai, meu Deus! – será que instinto existiria

que as falhas da velhice ensinaria,

a vida inteira só nisso a se empregar?

quem sabe aos poucos, igual nos chega a dor

e nos ensina a gemer, com o mesmo ardor

a gente possa aprender desesperança!...

eu só espero a caducar não aprender,

de quase tudo que sei hoje me esquecer,

enquanto aprendo de novo a ser criança!

AMPUTAÇÃO BURRAL I – 1º OUTUBRO 2018

Dizem que não se corta o pé de um burro

só porque nos deu um coice o infeliz!

Há muita coisa nisso que o povo diz:

em ponta de faca melhor não se dar murro!

É bem provável que de dor se dê um urro...

Bem certamente, isso é coisa que não fiz,

nem nunca dei qualquer soco no nariz

de qualquer um que me lançasse um zurro!

Aqui a ideia não é só de paciência

e nem ao menos de longanimidade,

nem simplesmente de agir com complacência,

mas de evitar um tolo desperdício,

que um certo grau de magnanimidade

pode até mesmo livrar alguém de um vício!

AMPUTAÇÃO BURRAL II

Diz, por exemplo, que não se deve despedir

um operário só porque foi grosseiro

ou logo após cometer o erro primeiro,

que uma outra chance se lhe deve conferir.

Do mesmo modo, se um amigo nos ferir,

por um engano, o que é bem corriqueiro,

que não se deve dar um corte derradeiro,

nessa amizade, para nunca mais possuir.

Diz igualmente, para questões de amor,

em que é comum haver certa discordância,

sem que se queira depois fazer as pazes,

que muito mais se perde do candor

por manter esse carinho a uma distância,

recomendando pensar bem em quanto fazes!

AMPUTAÇÃO BURRAL III

Mais do que tudo, sempre é mais importante

não fazer dos próprios pés a amputação,

a cada vez que fracassar uma intenção,

no desistir de tentativas ser constante!

É tão comum uma tolice assaz gigante

de se recuar ante qualquer contradição,

cortando a obra que não teve aceitação

e num descarte, nada mais levar adiante!

Não se corta o pé do burro e nem do amigo,

nem uma rusga se transforma em mal de amor

ninguém ampute um dom que traz consigo!

Mas ao contrário, ao burro a gente ensina,

pazes se faz num momento de calor,

de um bom futuro esperando ter a sina!

William Lagos

Tradutor e Poeta – lhwltg@alternet.com.br

Blog: www.wltradutorepoeta.blogspot.com

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