O Jardim de Cliff

Cliff é um garoto de oito anos. Ele é baixinho, possui uma cor de pele clara como a de um pêssego, seus olhos são castanhos e seu cabelo é bem loiro, da cor da gema de um ovo de galinha. Um garoto calado, tímido e não sorri muito. Não possui irmãos ou irmãs. Seus pais o amam mais do que tudo na vida deles, pois Cliff sofre de uma doença chamada Autismo. Por isso o pobre garoto tem suas dificuldades de se comunicar e interagir com outras pessoas. Sempre que ele quer perguntar ou responder alguma coisa, Cliff sempre olha para o chão e não para os olhos das pessoas.

Mas isso não impede de nosso menino ser feliz. Na sua casa onde mora, há um jardim muito bem cuidado, seu pai é jardineiro nas horas vagas, deixando o jardim da família sempre tão bonito e vivo.

Todas as tardes, Cliff vai para o jardim brincar em seu mundo imaginário, onde o jardim se transforma em uma floresta imensa cheia de perigos; borboletas são monstros maléficos compridos com suas assas e garras que rasgam suas vítimas; grilos são cavalos voadores, besouros aqui são gigantes, árvores dão conselhos ao jovem cavaleiro o qual Cliff se intitula para proteger o reino dessas criaturas terríveis.

Como Cliff não freqüenta ainda a escola por causa de sua situação mental, um professor particular comparece a sua casa para poder ensinar as coisas básicas que uma criança de oito anos tem de saber para não ficar tão atrasado nos estudos se comparado as outras crianças. Ele também possui um médico particular que o acompanha em sua evolução para a cura de seu autismo. Cliff gosta de ambos, pois eles o incentivam a adentrar na floresta para derrotar qualquer coisa que ameace a paz do reino que fica próximo a grande floresta.

Em uma tarde qualquer de verão, seu pai o chamou até o jardim para mostrar a nova flor que ele havia plantado. Era uma rosa, tão vermelha como o sangue que saiu do joelho ralado de Cliff quando caiu da escada de sua casa uma vez. Seu pai disse que aquela flor era uma das mais lindas do jardim de agora em diante. Em meio ás orquídeas, margaridas, tulipas, girassóis, a rosa se destacava por suas pétalas intensas.

Assim, neste dia de sol, começou mais uma aventura de Cliff na floresta perigosa. A rosa em seu imaginário logo se transformou numa árvore vermelha, que ao seu redor possuía uma aura em chamas, se tornou o ser vivo mais sagrado da floresta, pois ela sabia de tudo; do passado, presente e futuro. Nisso, ela dissera a Cliff que no fim da floresta, dentro de uma caverna escura, estava surgindo um monstro tão horrível e cruel, o qual se ninguém o derrotasse ele poria fogo em toda a floresta, e depois, no reino, acabando com a vida de muitos moradores inocentes. Coube a Cliff, o dever de enfrentar a temível fera que ameaçava destruir tudo.

O nobre cavaleiro fora adentrando na floresta com sua espada em punho pronto para qualquer desentendimento que alguma criatura porventura viesse a atrapalhá-lo em seu objetivo. Porém, nada de mal fora encontrado em seu caminho. Todos os bichos da floresta neste dia deixaram o paladino passar. Eles também estavam torcendo para que ele derrotasse o monstro que estava querendo por fim a moradia deles.

Quando fora se aproximando da caverna onde a fera estava, Cliff sentiu que a floresta ficara mais escura, sem vida, sem barulho dos pássaros, sem luz. Uma névoa densa que surgiu fez com o ar ficasse pesado, tenso.

Cliff avistou a caverna onde a árvore sagrada disse que estava o monstro. Não precisou que ele entrasse na caverna, a criatura sentiu sua presença e logo veio para fora, para afugentar o cavaleiro que estava em posição de atacar. Mas quando o animal ficou á frente do corajoso cavaleiro, é que se pode ver que bicho era aquele. Era um dragão. O monstro alado era enorme, muito maior que seu adversário com armadura de ferro. Possuía escamas como de um crocodilo, sua pele era muito dura de cor esverdeada, seus olhos eram vermelhos, suas garras pareciam mais com lanças afiadas e sua boca estava babando de vontade de devorar o pobre cavaleiro que o olhava lá de baixo.

Entretanto nosso garoto não demonstrou medo do dragão. Sem perder tempo, ele fora para cima do bicho com a espada afiada sendo segurada pelas duas mãos. Correu em direção ao bichano que teve dificuldade de acompanhá-lo devido a sua agilidade. O jovenzinho entrou por baixo do corpo do dragão, subiu em sua cauda e fora subindo em direção a cabeça. Quando o escamoso se deu que Cliff estava na sua cabeça ela a sacudiu, fazendo Cliff pular para um galho grande e grosso que dava para alcançar da cabeça da fera. O dragão ficara procurando Cliff, até que o menino assoviou para ele; então o monstro serrou os dentes, com o intuito de mostrar tamanha raiva que o cavaleiro o fez passar devido a sua astúcia em ficar protegido na árvore. Fora quando o dragão iria mostrar sua arma mais mortal. As chamas que saiam pela sua boca escamosa. Cliff estava preparado para tudo naquele momento. Porém, quando o dragão soltou o fogo em direção ao cavaleiro, este pulou para outro galho mais em baixo do qual estava e foi deslizando na árvore até parar no chão. O dragão ainda ficou alguns instantes esbravejando o fogo na guampa. Devido ao fogo ser muito intenso, a claridade dificultou a visão do dragão em ver que o cavaleiro escapou para o chão.

Quando o dragão se dera conta de que Cliff tinha se saído ileso, ficara muito mais raivoso ainda. Ele rugia e se debatia. Cliff estava apreensivo, esperando a segunda rodada de fogo que surgiria a qualquer momento. Fora quando um barulho vindo de cima não deixou as chamas surgirem novamente. O galho onde Cliff ficara estava se partindo da árvore, e que em um piscar de olhos, não dera tempo para que o dragão desviasse atingindo sua cabeça. Assim, a fera ficara tonta com a pancada e caiu zonzo no chão. O cavaleiro não perdera tempo e subiu rapidamente naquele corpo que agora deitado, parecia um jacaré gingante. Com sua espada fincou ela em sua cabeça, derrotando assim de uma vez por todas o dragão que tanto ameaçava a floresta e o reino com sua raiva.

Cliff por sua vez, estava sentado em cima da fera refletindo que seu plano saiu como havia planejado. O intuito de subir até a cabeça do monstro era ficar naquele galho e ir cortando com sua espada o galho que Cliff sabia que o dragão o incendiaria quando o avistasse nele. Com o fogo queimando já um corte profundo do galho era só questão de pouco tempo para que ele caísse em cima do bichano, o levando a ter uma vantagem para derrotar a fera, pois ela estaria enfraquecida com a pancada na cabeça. Findo tudo isso, havia mais uma preocupação para o nobre. Voltar até o início da floresta. Agora que o inimigo de todos fora derrotado, as outras criaturas da floresta não deixariam Cliff passar tão pacificamente desta vez.

Não teve outro jeito do que descer do corpo já morto do dragão e enfrentar seus inimigos no interior da floresta. Já descansado, o jovem com armadura metálica se pôs a seguir rumo a mais uma aventura.

Dessa vez já era noite, e neste período, a floresta fica muito mais perigosa, porque algumas criaturas só saem á noite, por ter hábitos noturnos, é o caso do morcego branco; um rato de quase dois metros que possui asas de tamanho dobrado, ele se alimenta de carne, por isso é muito comum nas manhãs, aparecerem animais menores mortos com o sangue todo drenado e membros faltando em seus corpos. Mas ele possui uma fraqueza. Ele teme o fogo. E como nosso paladino é muito esperto, pegou um galho seco de uma árvore, aproximou o nas chamas do galho que caiu na cabeça do dragão e saiu o segurando, iluminando o caminho e também para afugentar criaturas como o morcego branco.

Neste meio tempo que Cliff estava seguindo até a entrada na floresta, sentiu que muitos olhos o encaravam atrás das moitas, em cima das árvores, podia sentir várias animais com asas o seguindo, o farfalhar delas dava arrepios no cavaleiro, mas ao mesmo tempo ele estava preparado para uma possível emboscada ou uma luta com quem que fosse. Ele teve a excelente idéia de cantar algo que tranqüilizasse ele e quem estava o seguindo e observando. Lembrou da canção dos fortes cavaleiros ancestrais o haviam ensinado quando estava na Guarda Real do rei:

‘’ Vós que sois filhos da esperança, vós que sois filhos da justiça, vós que sois as últimas crianças, vós que sois filhos de Júpiter. Não deixem que caiem nas ilusões de ouro, prata ou cobre. Pois a ganância alimenta a ilusão. Sejam sempre guerreiros ungidos de virtudes e da razão. Pois honrado é aquele que empunha a espada perante a qualquer vilania, e não aquele que a embainha diante das palavras.’’

Essa canção funcionava também como uma oração de proteção para os cavaleiros do reino. Cliff a repetiu umas cinco vezes até escutar um barulho que vinha do seu lado direito. Estava muito escuro e ele não conseguiu distinguir a sombra que estava parado e o encarando.

A sombra aos poucos fora tomando forma. Ao chegar perto do galho flamejante, Cliff viu de que era um lobisomem. Mas não era um lobisomem qualquer, era o Victor, a voz que representava as criaturas maléficas da floresta. O cavaleiro não pensou duas vezes e pegou na sua espada, entretanto Victor fez um sinal com sua pata direita como se fosse um sinal de pare. Então Cliff parou e esperou que a criatura se explicasse. A fera peluda deu um passo á frente e disse ao cavaleiro que as criaturas da floresta estão salvas graças a sua bravura em enfrentar o dragão. Em sinal de agradecimento, deixaremos você passar sem interrupções até o seu destino. Contudo, na próxima vez que vier para o interior da floresta, será como antes, se tornará nosso inimigo mais letal novamente. Ao escutar aquilo, Cliff fez um aceno com a cabeça e seguiu adiante. Notou que as criaturas da floresta, não estavam presentes mais em sua caminhada. Logo ele chegara onde havia começado toda sua saga em busca do dragão. A árvore sagrada o agradeceu mentalmente e disse para descansar que agora estava seguro. O cavaleiro então despiu de sua armadura e deitou nos campos floridos que tinham ao seu redor, e pegou no sono.

No crepúsculo do dia, seus pais o chamavam para o jantar, mas Cliff não respondia. Achando aquilo estranho, seu pai fora até o jardim o procurar. Achou-o deitado dormindo em baixo de uma figueira, todo ralado, sujo e com uma expressão no rosto de contente, ou para nós, de quem havia derrotado uma fera. Seu pai o pegou pelos braços e o carregou até o sofá. Ali, seus pais o ficaram olhando, pensando que o seu filho, era uma pessoa sadia, apesar de seu autismo que atrapalhava a relação com o mundo. Mas nós sabemos o quanto Cliff é corajoso em seu mundo. Nesta noite, tanto o jardim da casa de Cliff, como a floresta perigosa vão dormir em paz, pois os perigos que lá existem, foram derrotados por um bravo e jovem cavaleiro de armadura de ferro e coração de ouro.

E ali no sofá, Cliff ficou dormindo até ser acordado por seus pais para tomar banho. Cliff podia ser muitas coisas, menos um cavaleiro sujo. Afinal, haverá alguma donzela por aí, querendo ser salva por um garoto sonhador e cheiroso.

Samyr Freitas
Enviado por Samyr Freitas em 13/02/2018
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