O Soldadinho de Guerra

Certa vez, um dinossauro chamado Tatá andava pelo vale dos Dinossauros Verdes. Tatá não era como os outros dinossauros. Gostava bastante de conversar com todos que encontrava pelo caminho, o que era contra as regras dos Dinossauros Verdes. Os Dinossauros Verdes só podiam conversar com outros da mesma espécie.

Certo dia, Tatá encontrou um soldado de guerra. Sua curiosidade logo despertou porque nunca havia visto nada parecido com aquela figura. Foi logo perguntando ao soldadinho:

- Como é teu nome? De onde vens?

O soldadinho achou estranho um Dinossauro se dirigir a ele, já que o mesmo era de uma espécie diferente.

- Meu nome é Billy. Sou de um lugar muito longe, acho que um dinossauro como você não deve conhecer.

- Se me dizer de onde vens, terei a oportunidade de conhecer.

Billy deu uma gargalhada.

- Você? Um dinossauro? Nem nunca saiu daqui, como poderá conhecer o lugar de onde eu venho?

Tatá pensou, pensou, pensou.

- Poderei imaginar. Mas só farei isso se me disser de onde vens.

O soldado de guerra, vendo a insistência do Dinossauro, decidiu responder à pergunta.

- Sou da Terra.

Tatá então pôs sua imaginação para funcionar. Imaginou um lugar onde a terra era macia, as árvores bem verdes, a água cristalina, o ar puro... imaginou que gostaria de viver por lá.

- E por que está aqui, caro soldadinho?

Tatá percebeu que a expressão do soldadinho mudou de séria para um olhar muito triste.

- Estou aqui porque não tenho para onde ir. Estou há muito tempo andando de planeta em planeta para ver se encontro um lugar para ficar.

- E por que saiu de seu planeta? Lá parece um lugar muito bom para morar.

Billy soltou uma gargalhada. Era a primeira vez que ria depois de muito tempo.

- Eu fugi de lá. A ganância do meu planeta está matando muita gente. As pessoas estão em guerra umas com as outras.

O pequeno Dinossauro verde ficou triste pelo soldadinho de guerra.

- Para onde pretende ir agora?

O soldadinho de guerra franziu a testa.

- Acho que irei para o planeta da Máquina de Costura. Talvez eu me identifique com alguma coisa de lá. Quem sabe possam remendar meu coração que já sofreu por tanta coisa.

- Como assim? - A curiosidade de Tatá aflorou mais do que antes.

- Meu coração já sentiu todo tipo de sentimento em meu planeta. Temos que matar uns aos outros sem que tenham feito algo para nós. Existem pessoas muito grandes por lá, pessoas essas que mandam em pessoas pequenas como eu. Você luta para sobreviver.

- Por que você não vai para o planeta das Pérolas? Lá as pessoas são tão valiosas como um colar de brilhantes.

Tatá ouviu um barulho vindo da floresta, logo depois viu algumas luzes aparecerem e ficarem cada vez mais forte. Percebeu, então, que o festival da Vela se iniciara.

- Ei, por que não pega carona com o calor das velas? Elas viajam até outros planetas para levarem luz e esperança.

O soldadinho achou aquilo uma boa ideia. Poderia chegar até o Planeta das pérolas de forma segura.

- Por que não vem comigo? Poderíamos viajar até lá. Considero você meu amigo, gostaria que fosse.

- Não posso. Minha espécie não permite. – Lágrimas brotaram dos olhos de Tatá.

- Mas somos da mesma espécie, não? Somos todos frutos da mesma criação.

- Difícil é fazer com que nossos irmãos entendam isso.

Então Billy percebeu que aquele planeta não girava em torno do sol, e sim de algum sentimento ruim que ele não sabia identificar.

Billy, então, viajou com o calor das velas e parou no Planeta das Pérolas. Billy sentiu uma sensação diferente ao pisar no novo planeta. Era tudo muito branco, brilhante. As árvores eram cintilantes, um branco muito vivo. Não eram verdes como as árvores comuns. Billy estranhou um pouco. Não se identificou muito.

Quando começou a caminhar, deparou-se com um coelho amarelo cor de ouro.

- Olá, meu jovem soldado. O que procuras aqui?

- Um novo lar, caro coelho. Pode me ajudar?

- Não posso. Estou ocupado indo retocar a cor de meus pelos para uma nova tendência. Se quiser fazer o mesmo, posso te levar até lá.

- Ah... – A voz do soldadinho falou. Então esse era o tipo de valorização que o dinossauro havia falado. Percebeu, então, o porque de tudo ser muito brilhante. Tudo era valorizado pela vaidade.

O soldadinho começou a chorar, não queria aquele tipo de coisa. Seu coração havia ganhado mais um novo sentimento ruim.

- Não posso ficar mais tempo aqui, soldado. Preciso retocar meus pelos logo antes que Pite Rosa vá na minha frente.

O soldadinho se assustou.

- Quem é Pite Rosa?

- Um coelho que tenta sempre estar mais bonito que eu... – E assim, com sua voz sumindo por conta da distância que o coelho tomava do soldadinho, ele se foi. Apressado. Pulando para além do que os olhos de Billy podiam ver.

O soldadinho sentou-se triste na terra branca do Planeta das Pérolas. Precisava dormir, descansar. Estava faminto. Então, lembrou-se do que fazia quando estava na guerra com seus irmãos. Ao sentir fome, ele dormia para tentar esquece-la. Isso funcionou por várias vezes.

- Quem sabe se eu não dormir... talvez eu consiga sair deste planeta através dos meus sonhos. – Disse a si mesmo.

Então dormiu. Sonhou com diversas coisas. Sonhou com sua família, com seus amigos, com a guerra furiosa que habitava seu mundo. Depois de muito sonhar,

acabou despertando. Seus cabelos se encontravam molhados de suor, sua pele estava grudenta por causa do calor que sentia. Percebeu que estava em um lugar diferente, não era mais branco luminoso. Era bem distinto, até mesmo o cheiro, que antes de perfumes diversos, agora parecia com de hamburguer, batata frita, sorvete e refrigerante. Onde será que estava?

Resolveu se levantar. Suava ainda mais, parecia que seus planos de mudar de planeta através do sonho tinham dado certo. E, puxa! Esse cheiro gostoso, o que será que era? Será que ele poderia comer alguma coisa dali? Sua barriga roncava muito. Seu estômago doía.

De repente, achou um pote com sorvete de chocolate. Seus olhos faiscaram. Aquilo devia ser muito bom. Se provasse só um pouco talvez não faria falta para o dono, pensou consigo mesmo.

- Só uma colher... – Então ele provou. – Hummmm, que delícia!

Seu cérebro começou a enviar comandos de felicidade para seu corpo. Ele pulou de alegria, dançou, até cantou. E, à medida que enfiava mais outra colher cheia de sorvete na boca, sua memória e sentidos iam se dissipando.

Depois de um tempo, foi achando pedaços de pizza, batata frita, frango assado com molho. Tudo que agradava seu paladar e olfato.

Três ano se passaram.

O soldadinho se encontrava mais pesado do que antes, quando havia chegado ao planeta. Sua farda quase não cabia mais em seu corpo. Seu rosto já ganhava um formato arredondado e suas bochechas estavam mais volumosas.

- Isto aqui está muito bom. E que fome! Vou comer só mais um pedaço dessa pizza. – E mordeu. – Hummmmmmmm! E quem sabe essa torta de limão. Parece muito boa.

Cada dia que o soldadinho passava naquele planeta, comia mais.

Numa manhã dessas de verão, o soldadinho estava saboreava seu pedaço de frango frito. Quando se deu conta, havia uma capivara sentada em sua frente, encarando-o.

- Quem é você? Por que está parada aí? Venha comer!

A capivara olhou em torno de si. O planeta parecia uma panela de cozinha. Tudo em volta era feito de comida. Apesar de estar com fome, ela não quis comer.

- Meu nome é Princesa. Eu vou continuar parada aqui e eu não quero comer.

O soldado Billy se enfureceu com a forma que Princesa falou com ele.

- Então está tudo bem, passe fome.

- Não passarei fome, mas você sim.

- O que quer dizer com isso, sua capivara afrontosa?

Princesa sorriu.

- Você vai comer isso tudo, ficará sem comida.

- Claro que não. Você não sabe de nada que fala. Vamos, saia da minha frente agora!

- Sua arrogância me assusta, pequeno soldadinho. Olhe em volta, veja todas essas pessoas que estão na mesma situação que você.

O soldadinho parou por um momento e olhou em sua volta.

- Não vejo nada, está mentindo para mim e tentando me enganar!

- Estou tentando enganar você? Não ganharia nada em troca disto. Você está cego, precisa abrir os olhos e enxergar.

- Só eu sei do que vejo, você está mentindo para mim! Pare!

- A pior cegueira é a mental, que faz que com que não reconheçamos o que temos a frente.

E assim, a capivara saiu. Billy, então, resolveu caminhar pelo vale. Por onde andava, enxergava as coisas como havia enxergado quando a capivara o questionou. - Capivara boba. Não sabe de nada. E acima de tudo ainda é mentirosa. Lá longe, o soldadinho viu um vulto se mexer em meio as montanhas de doces. O que seria aquilo? Foi até lá, cauteloso. - Olá? Quem é você? O vulto parou.

Billy percebeu que se tratava de outro soldado. Ficou feliz por encontrar alguém que parecia um pouco familiar para ele. - Comer... comer... comer... comer... comer – Disse a figura a sua frente. - Ei, está tudo bem. Pode me dizer o seu nome? – Billy perguntou novamente. - Comer... comer... COMER...COMER...COMER – O soldado foi se aproximando de Billy. - Co... Billy caiu no chão, batendo sua cabeça em uma pedra. Depois disso, tudo que viu foi uma leve escuridão tomar sua visão.

O soldadinho acordou meio tonto. Não sabia onde estava, nem que dia era. Se sentia leve. Olhou para seus braços, suas pernas, seus dedos. Tudo parecia normal. Fragmentos de seu sonho maluco iam e vinham à tona. Seu estômago se embrulhou. Não podia nem pensar em comida. Levantou, olhou ao seu redor. O lugar não se parecia com nenhum outro que tinha visitado anteriormente. Era perfumado, mas não tinha cheiro de vaidade. As árvores eram verdes, suas copas eram altíssimas, flores brotavam até do vento. O lugar era o que o soldadinho poderia considerar como paraíso. Billy pegou uma flor rosa e cheirou. Sentiu cheiro de saudade. Saudade de algo que não sabia decifrar. Onde será que estava? Será que havia morrido? Será que era um novo planeta que estava visitando? Sua mão formigava. Será que seria um sinal para ir embora? Seu coração se acelerou. Estava com muito medo. - Ei, rapaz. O que foi? Está perdido? – Uma voz soou atrás de Billy. Billy quis correr, mas permaneceu onde estava. Não sabia se eram suas pernas que não queriam fazer força para isso. Ficou. - Meu nome é Billy. Estou perdido por vários planetas. Faz muito tempo que viajo.

Então o soldado se virou, deparando-se com um senhor de idade que carregava um livro na mão.

O senhor de idade sorriu.

- Acho que foi tudo um sonho.

Billy coçou a cabeça. Olhou para suas roupas e não vestia mais farda. Estava com uma camiseta azul e uma bermuda normal. Como se estivesse em casa.