MAS CONTUDO (conjunção + conjunção) ou MAS CONTUDO (conjunção + qualquer coisa)?

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O Hebreu e o Herculano são irmãos, "MAS CONTUDO" não se falam (adaptado).

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Para José Carlos de Almeida (2011:115), " 'mas contudo' não se diz (...). Dizer 'mas contudo' é um erro. É uma repetição desnecessária."

No exemplo acima, será que aquelas palavras entre vírgulas altas assumem o valor de conjunções adversativas? Fique dentro de tudo lendo o que está abaixo!

Ouve-se, por aí, dizendo que não se pode usar a construção "mas contudo", pois, segundo alguns tradicionalistas, "mas" e "contudo" pertencem à mesma categoria gramatical, assumindo, de igual modo, o papel de conjunções coordenativas adversativas. Assim, e ainda na visão deles, não se justifica o emprego de ambas partículas concomitantemente. Em casos do género, passa a ser mesmo um verdadeiro atentado gramatical ao bom corpo da língua portuguesa de Portugal.

Ora, o que eles não sabem, é que em frases em que aparece a construção "mas contudo", o falante, ao construi-la, sabe claramente o que deseja transmitir. Uma reflexão, uma análise e uma conclusão mais profunda evita que certos pareceres e ilações meio preconceituosas sejam tiradas. Assim, não se pode, e essa é a nossa opinião, analisar simplesmente as categorias morfológicas, bem como o valor semântico atribuído pela gramática àquelas palavras isoladamente.

Em "mas contudo", somente o primeiro elemento, "mas", figura como conjunção. De recordar que nem sempre "mas" poderá simplesmente assumir o valor de uma conjunção, pois pode, de facto, assumir os valores de "nome" ou de uma partícula explectiva. É possível, a respeito do que dissemos, ler em Houaiss, Dicionário Electrónico da Língua Portuguesa; em Prontuário de Erros Corrigidos de Português, de D' Silvas Filho, 2011; respectivamente.

O "contudo", nalgumas frases em que aparece depois de "mas", não assume o valor de uma partícula adversativa. Uma visão menos analítica faz com que, de antemão, sem algum esforço racional ou até se calhar um pouquinho de preguiça, chega-se a afirmar, tendo em conta aquele contexto, que ‘’mas’’ e ‘’contudo’’ são conjunções e que desempenham o mesmo valor, esquecendo-se de que, em contextos como o acima, somente o primeiro elemento carrega o valor adversativo. O segundo, dependendo do contexto, pode assumir outros valores — que não o de conjunção. Só porque a tradição gramatical diz que "contudo" é uma partícula adversativa, então, em todos os contextos ela deve assumir tal valor? Meu/minha amigo/a, tire essa ideia absurda da cabeça! Por exemplo, o A-Z, Dicionário Electrónico da Língua Portuguesa, regista o "contudo", para além de uma conjunção, como também um advérbio.

Vamos analisar, por ora, o exemplo abaixo, introduzindo "mas contudo", a fim de vermos o resultado final.

Exemplo 1:

O Abreu e o Herculano são irmãos, MAS CONTUDO não se falam.

Naquela frase, o 'CONTUDO' não é uma conjunção adversativa, e isso faz com que nós, em particular o Caetano, analisemos as palavras de acordo com os contextos frásicos em que se fazem presente. Por exemplo, há casos em que um verbo ou um advérbio pode transformar-se em substantivo. Em outras palavras, a gente disse que são os contextos que ditam as regras e, por intermédio desses contextos, as palavras ganham novas caras dentro de uma sentença e não fora dela.

Regressando ao "contudo", ele, aí, remete-nos para o valor de "apesar de serem". Assim, "O Abreu e o Herculano são irmãos, mas contudo (contudo: apesar de serem) não se falam". O mesmo acontece com "mas no entanto" que pode, dependendo do caso, equivaler a "mas no momento". Logo, simplesmente o "mas" equivale a conjunção; no entanto, é claro, equivale a "no momento" e não àquela locução conjuntiva que ela assume fora dum contexto frásico.

Quanto a isso, pode ficar descansado(a), caro(a) leitor(a), pois só "mas", em casos como aquele, assume o papel adversativo. O "contudo" e "no entanto", não, não desempenham.

Exemplo 2:

Hoje choveu, mas 'contudo' vou à escola.

Aquele exemplo, tendo em conta o emprego de "contudo", equivale a:

Hoje choveu, mas (apesar de ter chovido) irei à escola.

É, de facto, isso que os falantes tendem, fazendo recurso a construções como aquelas, transmitir.

Há que se fazer, pelo menos, um pequeno esforço a fim de se analisar, compreender e tentar, com uma visão ampla, explicar casos como aqueles acima, em vez de estar simplesmente no "correcto" e no "errado". Pessoa de cabeça grande não fica encarcerado no "sim" e no "não", pois procura dar volta à situação para que possa, efectivamente, compreender todos os porquês — e a velha tradição gramatical não garante isso.

Em o "mas contudo", nalguns casos, somente o MAS assume o valor de conjunção e, por último, CONTUDO de "apesar do momento", "apesar do facto", "apesar do ocorrido", "apesar do acontecido", "apesar de tudo", etc., embora o que eventualmente possam assumir ou equivaler a algo prescrito pela gramática — mas não é o que os falantes pretendem transmitir quando se servem daquela construção.

CaetanoCambambe
Enviado por CaetanoCambambe em 21/09/2016
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