POST IT - POEMAS EM RAMALHETES
“Sem querer fui me lembrar / De uma rua e seus ramalhetes / Do amor anotado em bilhetes / Daquelas tardes...” (Tavito Moura)
A letra dessa música é retrato muito bem feito e inspirado da poesia que foi minha formidável juventude. Ótimo que a tenha vivido e vívida! As mocinhas dos colégios (no meu caso, o Anchieta e o Marconi) faziam gato e sapato de nós, os meninos.
Como era bom imaginar a mera possibilidade de tantos pecados por cometer, a breve e fugaz visão de tentadores joelhos inalcançáveis. Não havia sido inventado o tal politicamente correto; o pensamento pairava sobre nós em vigília pronto a entrelaçar-se ao menor descuido. Que bom. “Free as a bird”, bem resumiu John Lennon.
Podíamos praticar, nas delicadezas dos assédios inovadores e criativos, o acolhimento às primeiras, segundas e terceiras das intenções mais disfarçadas; tentar ou pensar ousadias, sugerir transgressões e diatribes que os apelos da juventude insistiam sussurrar, aos gritos, nos ouvidos mais liberados.
Maravilha viver de olhos bem abertos a flutuar nas irresponsabilidades das utopias, contornando com engenhosidade e arte as limitações dos costumes, em cumplicidade implícita no silêncio veemente interrompido pelos suspiros de mútuas respirações submersas.
Os disfarces estampados nas barreiras simbólicas das meias-soquete, saias azuis plissadas, sapatos pretos de verniz, blusas brancas com manguinhas de sianinhas, que ainda pairavam nos ambientes, eram burlados pelos olhares pedintes que denunciavam o pulsar de “corazones calientes”.
Nas manhãs de todos os dias, no fugaz instante do despertar, “o amor anotado em bilhetes… e o som dos Beatles na vitrola” ainda penetram pelas frestas entreabertas nas janelas das minhas ruas ramalhetes.
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(11/08/2019)