AO AUTOR DESCONHECIDO

Prezado Senhor... Autor Desconhecido,

Infelizmente, não sei seu nome, tampouco seu endereço. Na verdade, nem sei se o senhor tem casa própria, e-mail ou ao menos um porto para se abrigar das tempestades da vida, afinal, o tenho visto por tantos lugares, vagando em tantas páginas... No mundo virtual, o senhor é uma estrela! Mas que pena! Não consegui ver o seu brilho, talvez porque estivesse camuflado ou escondido, tal qual sua identidade!

Venho hoje aqui, para termos uma conversa franca, gostaria que fosse olho no olho, mas isso também não é possível, porque nunca a sua face fora revelada, mesmo assim eu tento. Vim para falar das dores que tem causado, cada vez que esconde a natureza de um poema, de uma mensagem de fé, ou mesmo de uma simples frase. Diferente do que o senhor acredita, nenhuma obra é órfã... cada palavra, cada rima... nasceu de uma emoção, única em seu tempo e espaço. E cada emoção carrega em si uma estória, que pode até não ser de conhecimento público, mas deve ser respeitada no seu direito de se manter privada, mas que nem por isso é desconhecida. E, na sua ânsia de se fazer notar através da invisibilidade de outrem, o senhor esquece de viver o melhor e o real sentido daquelas palavras roubadas, que jogadas ao acaso, se perdem no vazio daqueles que não viveram seus momentos de criação.

Seria tão bom que o senhor compartilhasse dessa emoção. Veria o quanto é maravilhoso reviver momentos definidos e retratados naqueles versos que o senhor um dia decidiu que seriam seus. Quando vi seu desespero, em garimpar emoções alheias, senti uma enorme tristeza, pela tristeza que o senhor sentia, pelo vazio em que vivia, pelo silêncio em que aprisionara suas dores! Ah! E como dói não saber dizer aonde dói! Imagino quão solitária deva ser a sua vida, que nem mesmo a senhora inspiração, companheira inseparável de todos os poetas, tenha se aproximado para trazer-lhe alguns versos que acalentassem a sua dor.

É senhor, senti muito pelo seu sofrer solitário, mas senti mais pelos corações dos meus queridos amigos, poetas, amantes das letras ou simplesmente, mensageiros de emoções. Senti a dor dos meus amigos ao ver suas crias, sendo jogadas ao vento como filhas de ninguém, ou melhor dizendo, como suas filhas – do Autor Desconhecido. Senti suas lágrimas rolarem, não pelas palavras disseminadas pelo mundo, porque esse é seu propósito maior, mas pela ausência de emoções vivas, daquelas que arrepiam quando lembramos dos momentos vividos. Senti suas dores quando viram suas emoções banalizadas no meio de um discurso qualquer. Testemunhei a revolta diante do modo autoritário e desonesto com que o senhor tomou posse dos versos e das prosas, dizendo que eram seus.

Sim senhor... o senhor tomou posse das palavras, mas esqueceu-se de anexar os sentimentos, as estórias de vida, os amores mal resolvidos, os não-vividos e os bem-vividos. Esqueceu-se também da lua cheia, do brilho das estrelas que acompanharam o nascimento dessas pérolas, que são o tesouro da alma do poeta. Ah! Senhor, que pena que o senhor não saboreou do cafezinho quente que acompanhou as noites de insônia dos meus amigos, nem mesmo cinzas de cigarro no cinzeiro lhe restaram para lembrar da noite que passou em claro, debruçado sobre aquele monte de papéis, tentando retratar em palavras, um único momento de sua vida, que fosse de fato, a expressão viva do seu momento, da sua estória, da sua emoção, sofrida, alegre ou triste, mas que fosse única e tão somente sua.

Sei que ainda nos encontraremos por aí e quando esse encontro acontecer quero te falar, não das dores, mas da alegria que me faz renascer cada vez que expresso minhas tensões, medos, angústias, certezas e incertezas, através das palavras, ainda que desarrumadas ou em versos e pensamentos desarticulados, não importa a regra, importa sim a vontade de falar. Falar de amor, de dor, de alegria, de sonho ou fantasia. E ficarei muito feliz ao olhar nos seus olhos e saber que de alguma maneira, o senhor foi tocado por minhas palavras de tal forma que um dia, assim com fez com meus amigos, desejou tê-las como suas.

Até um dia,

Sandra Mara

* Arte digital by Márcio Farias: http://www.olhares.com/time/foto500741.html