Estar juntos, e(DuCa)damente

Wilson Correia

O “Centro de Artes de Amargosa: Diversidade, Universidade, Cultura e Ancestralidade (CaSa do DuCa)” foi reinaugurado dia 23 de setembro último. A programação foi para lá de generosa e contou com a arte de diversos “junta-mentes”: Coral Infantil (Amargosa); Grupo Arco-Íris (Cruz das Almas); Grupos de Capoeira de diversas localidades da zona rural de Amargosa; Grupo de Resgate Cultural da Comunidade do Tamanduá; Grupos de Samba de Roda de Amargosa; Exposição de obras de Artistas plásticos no espaço da CASA; Músicos cantores diversos (estilos: MPB, forró, rock, reggae, dentre outros); Performance de Grafite, rap e poesia; Arena poética e performática com artistas de diversas cidades; Mostra de curtas-metragens do Cine Rapadura; Exibição de vídeos de Led Beslard; Exibição do Documentário Recôncavo na palma da mão, produzido por Edinilson Mota Dias da TVE; Performances Itinerantes na CASA. Um momento ímpar, diverso, universal, culto e ancestral para quem vê sentido na articulação entre cultura, arte e educação.

Maravilha que o samba de roda, em plena rua, tenha nos reunidos todos e todas no compartilhamento do mesmo ar, em respiros de belo e em expiração do que se é. Rua rima com soberania popular, espaço político em que o poder não está previamente cabresteado ou autorizado. Espaço aberto, em círculo, em que o poder é o mais equitativamente compartilhado. Sem pirâmides e organogramas dos “carguismos” de nossas instituições, tão chicoteadas pelo aparelhamento de poderes asfixiantes e centralizadores, servis, desalmados, desamados, obtusos, brutos, desumanos. Ah! Como é libertador poder respirar o ar dado pela natureza, e não aquele que filtram para nossas narinas!

Da rua para o interior da CaSa. Da liberdade para a intimidade, não menos livre. Em que cada um pode servir, à mesa doméstica da intimidade doada, a arte que expressa anseio de vida, de justiça e de simplicidade. Poderia haver percurso mais simbólico do que esse? Ali, eDUCAdamente, foi esse o acontecimento. Só o belo por objetivo. O poder da beleza. Não vi entrar na CaSa a ganância miúda por poder que subjuga. Vi a arte, na forma de pessoas livres e espontaneamente ajuntadas, sendo lida, escrita, cantada, grafitada, desenhada, pintada, dançada, suada e abraçada por todos e todas.

Foi, sim, um ato eDUCAtivo naquilo que de mais político ele é: convencimento e ação vindo de dentro, da subjetividade, da soberania compreensiva de sujeitos em luta por expressão de si, de suas circunstâncias, de seus amores, reservas e batalhas cotidianas. Mas seres em eDUCAção. Colhidos pela eDUCAbilidade possível a quem se deixa guiar não pelo que o outro aponta, mas pela fome de belo que transborda em tantos quantos entendem que a vida carece de um vaso de flores da justiça aqui e de outro, de liberdade, em parelha. Política sã. Graúda. Robusta. Força de beleza a nos reunir. A nos encantar. Emocionar. A despertar o gatilho da cognição. Do pensamento. Do julgamento. Da escolha. Da decisão. Da ação. Quem duvida que tenhamos saído mais fortes para as lutas diárias dessa reinauguração?

Entendo que o eucalipto fincado na terra seja natureza e creio que este eucalipto transformado em papel A4 já tenha ganhado a forma da cultura. Cultura não passa de um modo humano de ser e estar no mundo. Por isso ninguém, homem ou mulher, dela é desprovido. E a arte, como expressão particular da cultura, é esse ato criativo e criador que implica os valores da beleza, equilíbrio, simplicidade, verdade, autenticidade, harmonia e, claro, revolta, inconformismo, contestação e resistência. Arte se faz com emoção, economia, poder, política, sentimento, pensamento e ideologia. Arte neutra não há porque o humano não é um Deus aquinhoado com o dom da ataraxia pura e etérea de quem não se mistura ou se suja do terráqueo ser.

Nessa condição, arte envolve o aprender, o ensinar, o conhecer e uma sabedoria que, nem sempre, entra ou é difundida na academia. Nessa perspectiva, a arte é aquele caminho pelo qual a reunião de pessoas não se dá pela via da cumplicidade para o feio (mal), mas pela amizade que cultua o desejo do belo (bem). Melhor forma eDUCAda de se estar junto não poderia existir.

Parabéns aos eDUCAdores e eDUCAdoras da CaSa do DuCa! Sexta-feira passada vocês nos ensinaram o que é estar juntos, eDUCAdamente. Que essa lição se torne um movimento e enriqueça nossas árduas práticas cotidianas de aprender, ensinar, ser e estar.