O Verdadeiro Problema do Mal

Habacuque é um livro profético, mas com uma peculiaridade interessante: embora tenha sido escrito para ser lido principalmente pelo povo de Judá, nunca se dirige diretamente a eles. Na verdade, é um diálogo entre o profeta e Deus. Os dois primeiros capítulos são organizados em torno das perguntas de Habacuque e das respostas do Senhor; o terceiro é uma canção. O profeta viu o rápido declínio moral e espiritual de seu povo, e isso o perturbou. Mas a resposta de Deus era ainda mais intrigante: Ele ia usar uma nação pior, a Babilônia, para castigar o seu povo eleito, Judá. Assim, segundo a ESV Global Study Bible, o livro apresenta quatro temas principais: Deus é justo e misericordioso, embora nem sempre compreendamos os seus caminhos; a maldade acabará sendo punida, e os justos finalmente verão a justiça de Deus; o Senhor usa pessoas perversas para punir outras pessoas perversas, mas no fim todos serão julgados; e os justos viverão pela fé.

Após a apresentação inicial, o livro começa com a seguinte pergunta: "Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! e não salvarás?". O profeta questiona a demora de Deus para agir diante do pecado e da violência. Ele fazia mal em questionar? Penso que não. A expressão "até quando" aparece em diversas orações na Bíblia. É um tipo de questionamento diferente da murmuração. Creio que não há um tom acusatório nessas palavras, mas um desejo sincero de que Deus se revele, pois a atual situação não condizia com o caráter do Senhor. Essa não é aquela reclamação que vem do egoísmo e cobiça, mas um apelo que flui do zelo pela glória de Deus.

Isso significa que quando uma situação nos parece errada, quando nosso coração não consegue descansar ao ver a injustiça e a violência, nós não precisamos esmagar nossos sentimentos e fingir que nada está acontecendo, mas podemos ser sinceros com Deus, confessar nossas frustrações e clamar que Ele se manifeste.

Um problema que o profeta levanta e é praticamente universal na história humana é o da violência. "Por que razão me mostras a iniquidade, e me fazes ver a opressão? Pois que a destruição e a violência estão diante de mim (...)" (v.3). Não faz sentido para nós saber que há um Deus de paz e justiça no céu, que é Todo-Poderoso, mas permite tanta injustiça e maldade. Ainda há um agravante em Habacuque: tal iniquidade era vista no próprio povo eleito de Deus, a quem Ele tinha o maior interesse em preservar. Do mesmo modo, muitas vezes ficamos surpresos e confusos sobre por que Deus permite tanto pecado na Igreja e deixa que Seu nome seja blasfemado por causa daqueles que professam seguir a Cristo. Uma primeira atitude que devemos tomar, nos ensina o texto bíblico, é orar a Deus humilde e sinceramente para que Ele intervenha.

O desejo dos justos é que a justiça divina se manifeste depressa, pois quanto mais o Senhor demora, mais a Lei de Deus é desrespeitada e mais os fracos são oprimidos pelos maus. Entretanto, Deus estabeleceu meios secundários de justiça. Não devemos apenas esperar que Deus haja, pois muitas vezes Ele espera que nós façamos alguma coisa a respeito do que nos incomoda.

Praticar a justiça não é apenas fazer o certo, mas também defender os injustiçados, garantir que os direitos das pessoas sejam conservados, lutar para que o justo aconteça, denunciar aqueles que quebram a Lei de Deus, odiar o mal, estabelecer julgamentos justos, chorar com os que choram e se alegrar com os que se alegram, falar a verdade, calar a mentira, acabar com toda forma de abuso, exigir a condenação dos culpados, rebelar-se contra a tirania, falar em nome daqueles que não têm voz, "visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo" (Tg 1.27).

Eis a resposta de Deus ao questionamento de Habacuque: "Vede entre os gentios e olhai, e maravilhai-vos, e admirai-vos; porque realizarei em vossos dias uma obra que vós não crereis, quando for contada. Porque eis que suscito os caldeus, nação amarga e impetuosa, que marcha sobre a largura da terra, para apoderar-se de moradas que não são suas." (Hb 1.5-6). Os caldeus foram uma tribo que viveu no litoral do Golfo Pérsico e se tornou parte do Império Neobabilônico. Na época de Habacuque, era uma nação cruel e perversa que dominou uma vasta região. Aqui temos um dos motivos por que Deus permite injustiça e violência: ele usa os ímpios para punir outros ímpios.

Considerando que todos os homens são pecadores, e que já nascemos pecadores (Salmos 51.6), não há qualquer inocente. Assim, Deus permite à humanidade ficar presa a esse mundo que ela mesma transformou em uma antessala do inferno para punir sua própria maldade. Tal procedimento divino fica ainda mais evidente quando Deus toma uma nação perversa para punir outra nação menos perversa que ela; e todo valente acaba achando alguém mais valente que o derrote.

Habacuque entendeu uma coisa importante sobre o coração de Deus: o Senhor está mais preocupado com a Sua própria glória do que com o bem-estar dos homens. Esse é o Deus da Bíblia. Não é verdade que nós estamos no centro do coração de Deus. Deus está no centro do coração de Deus. Tudo é sobre Ele. O problema maior do pecado não é que os homens sofrem por causa dele, é que Deus é ofendido em Sua beleza, santidade e justiça.

Esse é o verdadeiro problema do mal: como um Deus justo e infinitamente apaixonado pela verdade, bondade e beleza pode permitir que os homens continuem insistentemente a pecar contra tudo e contra todos e, aparentemente, não fazer nada? Nas palavras de Willian Lane Craig, a questão que enfrentamos não é como Deus pode se justificar conosco, mas como nós podemos ser justificados perante Ele sendo cheios de pecado e de maldade. Se, para muitos, o problema do mal é a maior objeção à existência de Deus, no fim das contas Deus é a única solução ao problema do mal. Se Deus não existe, então nós estamos perdidos, sem esperanças, em uma vida de sofrimento gratuito e sem significado. Deus é a resposta final ao problema do mal, pois Ele nos redime e nos leva à alegria eterna de um bem incomensurável: comunhão com Ele.

Outra questão importante que vale a pena mencionar é uma crítica que o texto bíblico faz à Babilônia no versículo 7: "dela mesma sairá o seu juízo e a sua dignidade". Ou, conforme a NTLH, eles "fazem valer as suas próprias ordens e leis". Isso significa que o homem não pode criar seus próprios padrões de certo e errado à parte da Lei de Deus. Somos nós que devemos nos adequar ao padrão do Senhor, e não Ele que deve fazer aquilo que nós consideramos justos. Por isso, não temos o direito de discordar do método de Deus para lidar com o pecado dos homens; Ele é Deus, não nós. Ele é quem dita o que é verdadeiramente justo, não nós. Cabe a nós aceitamos ou enfrentarmos as consequências.

Os versículos 8-9 demonstram um pouco da ferocidade dos caldeus e, consequentemente, do juízo divino: "E os seus cavalos são mais ligeiros do que os leopardos, e mais espertos do que os lobos à tarde; os seus cavaleiros espalham-se por toda parte; os seus cavaleiros virão de longe; voarão como águias que se apressam a devorar. Eles todos virão para fazer violência; os seus rostos buscarão o vento oriental, e reunirão os cativos como areia." Se havia violência em Judá, Deus tinha ainda mais violência para tratar com eles. Eles poderiam achar que a Babilônia estava muito longe, era um perigo ainda distante, mas quando Deus determinasse, a violência chegaria rápido como um raio.

Daqui aprendemos que ninguém está seguro do juízo de Deus. O pecador pode buscar toda forma de falsa segurança, mas quando o Senhor resolver alcançá-lo, nada vai impedi-lo. Todo o poder e riqueza é insuficiente diante da ira divina: "E escarnecerão dos reis, e dos príncipes farão zombaria; eles se rirão de todas as fortalezas, porque amontoarão terra, e as tomarão" (v.10).

Onde você tem tentado se esconder de Deus, achando que o teu pecado ficará impune? Se refletir adequadamente, se perceberá na situação do autor do Salmo 139: o Senhor conhece o teu assentar e o teu levantar, sabe os teus pensamentos, cerca o teu andar e o teu deitar, conhece todos os teus caminhos. Não havendo ainda palavra alguma na tua boca, Ele já sabe o que você vai dizer. Ele te cerca por trás e por diante. Você pode ir para a galáxia mais distante, e Ele estará lá. Pode ir para o mais profundo lugar no inferno, e Ele estará lá também. Se disser: "Decerto que as trevas me encobrirão", nem ainda a escuridão mais terrível poderá te esconder, pois para ele a noite e o dia são a mesma coisa. Onde você pode se esconder de Deus? Como você acha que vai poder escapar da Sua Justiça? A única saída para ti, meu amigo pecador, é buscar Nele perdão e misericórdia.