ARTESÃO DE VIDAS -V

S E R I A D O

ARTESÃO DE V I D A S

CAPÍTULO V

Alguns dias se passaram. Elza Santiago desmarcou algumas viagens de negócios que havia de fazer, motivos inadiáveis fizeram com que ela assim procedesse. Além de estar à frente dos trabalhos artísticos de Joab, igualmente recebera uma intimação do Juizado da Criança e do Adolescente. Estava marcada a primeira audiência sobre a adoção de Tádzio. Havia no recinto muita gente: Elza, Tádzio, Joab e Dr. Inaldo, advogado da causa. Do outro lado havia as presenças da madrasta de Tádzio que estava acompanhada do marido e do seu respectivo advogado. Foram apresentadas todas as queixas e as provas irrefutáveis de como a criança era torturada. O próprio Tádzio deu seu depoimento, acusando veementemente a madrasta e seu marido. Tudo

relatou e o advogado mostrou as fotos que comprovavam aquilo que ali estava sendo colocado. Os oponentes tentaram defender-se, mas

diante de tantas evidências, não tinham como expressar qualquer posicionamento. O Juiz pediu que se retirassem e que aguardassem do lado de fora sua sentença. A expectativa era intensa e um fato veio debelar em definitivo aquele caso. Sem pensar no que dizia, o que dizia e onde dizia, a madrasta de Tádzio não se conteve e falou em voz baixa, mas o suficiente para que Dr. Inaldo gravasse no celular:

- Claro está, Tádzio, que não perderemos sua guarda. Os pratos, o banheiro e as roupas esperam por você, além da sova que levará quando chegar em casa por nos colocar nesta situação tão deprimente.

Todos ficaram perplexos com a audácia da mulher e ela nem imaginava que o que dissera havia sido gravado. Foi sua total perdição.

Algumas horas depois, o Juiz pede para que todos entrem, já havia pronta a decisão.

- Escrivão, anote aí os seguintes dizeres forenses que é a minha decisiva palavra sobre este caso em questão...

Antes que o Juiz iniciasse a sentença, Dr. Inaldo, calmamente, pediu a palavra:

- Palavra concedida, Dr. Advogado.

Inaldo então ligou o celular e mostrou a gravação... O Juiz não tinha mais dúvidas a respeito do que se resolvera...

- Concedo a guarda definitiva do jovem TÁDZIO ALBUQUERQUE à senhora Elza Santiago, sem direito a recursos e apelações de acordo com...

O marido da madrasta de Tádzio assim disse a ela em frente a todos ali presentes:

- Estúpida!

Dirigiram-se ao Cartório do Fórum e pegaram a certidão de nascimento de Tádzio e toda a documentação em que constava a irrestrita adoção da criança por Elza. Nada mais havia de ser feito. Saíram dali muito felizes e foram comemorar.

Dias após estes acontecimentos, Tádzio recebia em sua residência os documentos escolares que lhe dariam direito de matricular-se e Elza o matriculou na mesma escola onde estudava Joab, só que Tádzio estava bastante atrasado, iria cursar o 6º. ano do ensino Fundamental, enquanto que Joab já cursava o 1º. do Médio.

Antes de todos estes fatos, Elza e os garotos foram até a residência de Breno Allende. Elza carregava consigo uma réplica do extraordinário trabalho de Joab.

Foram muito bem recebidos pelos pais do jovem, que ficaram perplexos diante do que estava ali sendo mostrado.

- Santo Deus! – disse a mãe do garoto – este é meu filho! Como puderam fotografá-lo assim nestes trajes?

Foi o pai de Breno quem interveio.

- Mulher, isto não é uma fotografia, é uma tela, um trabalho artístico feito pelo amigo Joab. Eu estou pasmo, não pela audácia do teor da tela, mas pelo fantástico talento do garoto. Nada tenho a contestar e, de minha parte, dou minha autorização para que este trabalho seja divulgado. Você quer, meu filho, que sua nudez seja exposta em público? Percebe-se que não é nada maldoso ou malicioso, porém um extraordinário trabalho de pintura que, de tão perfeito, conseguiu enganar sua mãe. Que diz Breno? A palavra é sua...

- Eu quero sim. Noto que é o começo de uma carreira que nunca pensei trilhar, mas este trabalho de Joab certamente fará com que as portas se abram para mim na profissão de modelo. Obrigado, Joab!

No dia seguinte todos estavam no cartório e assinaram as autorizações que concediam a Tádzio e a Breno o direito de verem as telas expostas em público. Diante da autorização dos responsáveis, o Juiz consentiu a divulgação e a comercialização da arte, bem como permitia que os mesmos pudessem trabalhar como modelos profissionais caso houvesse convites neste sentido.

Elza levou réplicas dos trabalhos numa exposição de arte. As réplicas foram arrebatadas por um preço altíssimo: cinquenta mil reais cada uma!

Expôs os trabalhos na internet e em sites especializados. O sucesso não se fez esperar. No e-mail de Elza choviam convites para que Joab pintasse personagens importantes, tanto da música como de atores e atrizes de televisão, teatro e cinema. Elza começou a viajar pelo Brasil inteiro, eram muitos os convites e os pedidos. O talento de Joab crescia que crescia. Estava ganhando muito dinheiro. O mesmo se pode dizer de Tádzio e Breno. Ambos entraram para um curso de modelos profissionais. Como eram belíssimos, sempre estavam sendo requisitados para comparecerem às passarelas de moda do país inteiro. Elza foi obrigada a pedir demissão de seu trabalho, porque não havia como conciliar seus interesses aos interesses dos meninos.

Acabaram de regressar de uma viagem que fizeram a São Paulo, onde Joab pintou telas de personagens famosas do meio artístico. Estavam confortavelmente sentados no sofá da sala e foi Tádzio que trouxe uma grande notícia, posto que estava a navegar pela internet.

- Joab, mãe Elza, vejam isto que acabei de imprimir e que se encontrava na linha de tempo de Joab.

Ficaram perplexos. Era um pedido de compra. Uma grande organização francesa estava a oferecer o equivalente a dez milhões de reais pelos originais das telas de Tádzio e Breno.

- Como é, mãe, vende? – Perguntou Joab.

- Você acha que podemos recusar uma oferta destas? É claro que vendo! Com o dinheiro compraremos nosso apartamento próprio. Vocês trabalham e eu os represento.

Elza entrou em contato com a organização francesa e fez o negócio. Em poucos dias o dinheiro estava creditado em sua conta e os originais remetidos para a França.

De posse de tão elevada quantia, finalmente começaram a percorrer a cidade em busca de realizar um grande sonho: a casa própria! Percorreram vários imóveis e se apaixonaram por um apartamento à beira-mar, na Zona Sul da cidade. Compraram à vista e desembolsaram a bagatela de 4 milhões pelo respectivo imóvel. Era um apartamento enorme: sala para quatro ambientes, 4 dormitórios sociais, todos

com suíte, imensa copa cozinha, dependências para 2 empregados do lar, biblioteca, despensa, enorme área de serviço, dois banheiros sociais... um imóvel de luxo!

Havia espaço para três carros na garagem. Botaram mobília nova e, um mês depois, já habitavam na nova residência.

Tádzio acabara de receber um convite: desfilar no maior e mais importante desfile de moda dos Estados Unidos. Estava radiante:

- Então, mãe Elza, eu aceito o convite?

- Lógico, meu filho. Iremos nós três. Quando será?

- Daqui a quinze dias. – Tádzio respondeu.

E se prepararam para a viagem. Compararam roupas novas, sapatos novos, tudo novo. Três dias antes do desfile, embarcaram. O evento dar-se-ia em MIAMI BEACH. Desfile muito concorrido. Tádzio fazia um grande sucesso. Era lindo e a pintura de sua nudez endoidava a tietagem. Estavam hospedados em importante e concorrido hotel da cidade. A imprensa não dava descanso e andavam tentando uma reportagem especial com o mais famoso modelo profissional do mun-

do no momento: Tádzio Albuquerque, um garoto de apenas 15 anos.

Tádzio e Joab resolveram conhecer a piscina do hotel. Era num dia pela manhã, o espaço estava tomado de gente e o rebuliço foi grande quando da chegada de ambos. Corre-corre, gente para todos os lados e a segurança teve muito trabalho para conter os fãs. Quem por perto estava, deliciou-se ao contemplar ao vivo as beldades, em especial Tádzio, que era o centro de todas as atenções. Tiraram muitas fotos dos garotos e os mesmos não puderam curtir a piscina em

paz, foram obrigados a se retirarem, para a frustração dos tietes. Assim que entraram de retorno aos aposentos, Elza estava com uma correspondência em suas mãos.

- Tádzio, importante revista americana convida você para uma sessão especial de fotos. Será publicada uma edição especial, só sobre você. Aceita?

- Quando eles querem que isto ocorra? – Interrogou Tádzio.

- Hoje à tarde. Caso dê uma resposta positiva, eles mandam buscar você. Claro que eu e Joab o acompanharemos, nada fará sozinho, especialmente enquanto for menor.

- E eles falam em cachê?

- Sim, oferecem trezentos mil dólares pelas fotos. – Confirmou Elza.

- O que você acha? Devo aceitar?

- Sim, mas não por esse cachê. Cobre o dobro. Se eles toparem pagar, você vai, caso contrário rejeite...

E a revista aceitou de imediato a contraproposta de Tádzio. À tarde deste mesmo dia, lá iam os três em condução especial para o local onde as fotos foram realizadas. O lugar era muito bonito. Tádzio foi fotografado com vestuário social, esportivo e de banho, em vários modelos. Ao regressarem ao hotel, estavam exaustos.

Estavam nos aposentos quando o telefone tocou. Elza atendeu:

- Sim, pois não...

- Aqui é da recepção. Há uma emissora de televisão que está a desejar uma reportagem com Tádzio Albuquerque. Trata-se de uma entrevista ao vivo e que será realizada aqui mesmo no ambiente do hotel, numa área reservada. Pagam excelente cachê por uma reportagem de meia hora. Haverá a presença de fãs, cinquenta ao todo, que chegarão perto do ídolo e receberão dele beijos, abraços e autógrafos. Ah, é a rede de TV de maior audiência nos Estados Unidos.

- Quanto oferecem de cachê? – Elza quis saber.

- Eles pagam trinta mil dólares, na hora, em espécie.

- Tádzio irá, mas não por trinta mil dólares, porém por cinquenta mil.- Elza disse.

- Volto a ligar em poucos minutos.

E não se passaram nem cinco minutos, o telefone toca outra vez.

- É da recepção. A emissora de TV paga o que Tádzio cobra.

E Tádzio arrumou-se e desceu rodeado por Elza e Joab. Foi diretamente levado para o ambiente da entrevista, onde havia muitos seguranças e um público ávido por tocá-lo, ouvir sua voz, ter seu autógrafo, seus abraços e beijos. Tádzio não chegou para quem quis. A tietagem ficou em derredor de si, ele atendia um, atendia outro... Depois o puseram sentado numa cadeira e um jornalista o bombardeou de perguntas e mais perguntas. Ele a tudo respondia com um sorriso nos lábios. Meia hora depois, deram por encerrado aquele encontro e Elza recebeu a “grana” do cachê.

No dia seguinte, Elza tomou uma decisão:

- Tádzio, hoje você não atende ninguém. Precisa repousar para o desfile de amanhã.

Assim foi cumprido. Apesar dos inúmeros convites e dos cachês altíssimos oferecidos, Tádzio Albuquerque obedeceu a Elza. Passou o dia inteiro no apartamento do hotel e até as refeições foram trazidas para eles. Descansou.

Chegara o dia do grande desfile. O local mais parecia um mar de gente. Muitos cartazes exibiam Tádzio: ora em trajes de banho, ora vestido socialmente, ora de forma esportiva e até houve quem trouxesse uma réplica da tela em que posara inteiramente nu. Era, incontestavelmente, um grande ídolo. E ele desfilou para o delírio do público. Primeiro apareceu na passarela com uma bonita roupa esportiva; em seguida, social e impecavelmente trajado... por último., apenas de sunga, numa propaganda para uma marca. Quase puseram abaixo o local do desfile. No final, houve de ser fortemente protegido a fim de chegar ao hotel.

No dia seguinte estavam de regresso ao Brasil. A fama os apanhou assim meio que de repente. No princípio sofreram muito, posto que perderam a liberdade do ir e vir. Com o passar do tempo foram se acostumando e agora nada mais era novidade. Mudaram de escola, foram matriculados num colégio mais caro e onde deveriam estudar mais. Certa noite, Tádzio e Joab dialogavam:

- Parece que foi ontem que tirei você do meio daqueles trombadinhas... –Lembrou Joab.

- Realmente – concordou Tádzio – o tempo passa muito depressa. Também parece que foi ontem que você inventou de me pintar e fazer uma tela de minha nudez... olha no que deu... – Frisou Tádzio.

- É... e seu projeto de estudar para engenharia de pesca, morreu?

- Não, não morreu. Agora eu vou aproveitar bem este momento, pois nem sempre estarei assim tão no auge. Vou ganhar o que tiver de ganhar e quando esta fase passar, eu colocarei em prática o curso que pretendo fazer.

- E você, não vai fazer arquitetura?

- Nem sei, Tádzio... Eu não tenho tempo nem para respirar... São tantos convites para pintar...

- Estamos ricos, não é irmão?

- Sim, estamos... mas será que vale a pena tudo isso se não podemos levar uma vida normal? – Joab quis saber.

- Para mim, vale, sim. No meu caso é mais passageiro, pois vida de modelo não é longa. Tenho de ganhar tudo agora, depois aproveitar a vida.

Adormeceram. Estavam cansados.

AMANHÃ - CAP. IV - O EPÍLOGO

Ivan Melo
Enviado por Ivan Melo em 02/12/2014
Código do texto: T5056228
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