O Fator Caos capítulo 2 - Ciúmes cibernéticos

CAPÍTULO 2


CIÚMES CIBERNÉTICOS


Na tela de seu Kempis 8434 uma bolinha vermelha começou a piscar. Andrômeda teclou o mapa local e a planta de Lorena foi se descortinando, atravessada pelas coordenadas cartesianas. A bolinha insistia em permanecer à margem, no canto direito superior. Com a direção Sonia foi seguindo a bolinha e descortinando o mapa para nordeste, até que afinal, já além da Sapucaia, o sinal pôde ser enquadrado. Andrômeda digitou em seguida o medidor de escala, diminuindo-a rapidamente até 1 km/10 cm, depois acionou o captador satelítico para forçar uma ampliação ainda maior. A escala diminuiu radicalmente e a planta foi sendo substituída por uma visão clandestina da cidade, a tal ponto que o sinal vermelho agora piscava sobre as cumeeiras de uma casa sombria e imensa, situada na periferia do Ipê Amarelo.
Mais do que isso Andrômeda não podia conseguir. Virou-se para Leiber:
— Traga-me as roupas.
— Muito bem, Andrômeda. Precisará de mim?
— Sem dúvida, Leiber. E chame a Liz.
Nos minutos que se seguiram Andrômeda deu uma olhada na correspondência e nas notícias. Chamou sua atenção o desaparecimento, em Genebra, da Dra.Irene Wull, física ultranuclear. Outro cientista, o astrônomo e físico Prof.Coriano Bolaños, sumira no México.
Andrômeda teclou “missões”.
“Selecione tudo o que houver de desaparecimento de cientistas ou parentes de cientistas nos últimos seis meses.”
Tendo deixado Belle encarregada das pesquisas, Andrômeda começou a se trocar, colocando as roupas trazidas por Leiber. Um traje colante escuro, com botas sem salto, feitas com borracha especial; uma grande capa azul-escuro, da cor da noite; uma estranha máscara que lhe cobria os cabelos ruivos e ocultava a maior parte das suas feições, emoldurando os olhos azuis; e um cinturão com truques. Andrômeda usava ainda luvas pretas.
Seu traje era de mangas curtas. Ela não via razão para sentir calor e, na verdade, possuía até um regulador térmico.
Liz veio vindo devagarinho.
— Que bom que vamos nos divertir, Andrômeda!
— Prepare-se porque não sabemos o que nos espera.
— Não há problema, Andrômeda.
— Isso é só retórica. Eu estou achando que os problemas serão muitos.
— Leiber vai conosco dessa vez?
— Vou levá-lo.
— Eu não gosto de robôs e você sabe disso.
— Oh, cale-se! Vamos agir!
— Andrômeda — disse Leiber, com sua voz de monstro das cavernas — por que você não troca de carro?
— Cale a boca você também! Troquem suas identidades!
Só uma milionária como Sonia teria os recursos necessários para possuir um cambiador de identidade eletrônica para servos mecânicos, aparelho de uso proibido. Muita gente rica tinha dessas coisas, inclusive conjugues infiéis.
Andrômeda instalou uma valise em Liz e os três partiram.
Um hábil jogo de hologramas na montanha evitava que a aparição de Liz na estrada chamasse atenção. Sonia, ou melhor, Andrômeda, agora dirigia em alta velocidade pela estrada da Serra da Mantiqueira, disposta a esclarecer logo o mistério.
— Calma, Andrômeda. Você está muito tensa — observou Liz.
— Talvez.
— Você está tresnoitada e ás vezes abusa desses anti-soníferos. O corpo humano tem limites que você não pode ignorar, mesmo sendo Andrômeda.
— São três horas da madrugada — lembrou Leiber. — A que horas você vai dormir? Depois dessa festa...
— O que vocês querem? Que eu durma durante umas dez horas e cuide desse caso depois que a garota for estuprada e morta? Meu corpo vai ter que aguentar.
— Lembre-se dos seus limites — insistiu Liz. — Em certas ocasiões você é temerária, você parece se julgar invulnerável e indestrutível. E você não é. Você pode ser morta.
— Grande novidade — ironizou Andrômeda, pisando no acelerador.
— Posso ligar o holocedê? — perguntou Leiber. — Quero ouvir um neo-rock...
— NÃO! — disse Andrômeda.
— Mas...
— Cale a boca, sua lata! — Andrômeda parecia estar de mau humor. — Nós não estamos dando um passeio.
O celular de Sonia tocou.
Andrômeda atendeu, e a tele-holo do carro mostrou Belle, a computadora:
— Mestre, já fiz a pesquisa.
— E aí, Belle?
— É impressionante. No sistema humano, quatorze desaparecimentos de cientistas. E parentes, cerca de vinte.
— Contando com essa última?
— Isso aí.
O olhar de Andrômeda endureceu.
— Não pode ser mera coincidência. Meus amigos, algo vem acontecendo há tempos sem que a gente perceba. Algo sinistro e hediondo. Seja o que for, é hora de dar um basta a isso.
— Quem dará o basta, Andrômeda? Você? Você é uma pessoa só, e nem tem respaldo oficial.
— Com você me animando, será fácil — o sarcasmo de Andrômeda era cortante.
Seguiu-se um silêncio. Andrômeda concentrou-se na direção, naquela estrada escura e assustadora. A lua, porém, era cheia.
— O lobisomem aparece na lua cheia — lembrou Leiber.
— Cale-se! — gritou Liz.
— Que foi, querida? Está com medo? — e o robô riu.
O carro passou velozmente pelas primeiras casas, ultrapassou uns poucos veículos e, em mais quinze minutos, chegou finalmente ao seu destino.


continua...