RP - RETORNO... - PARTE 5

RETORNO...

PARTE V

Miguel para de falar. A garganta arde. Os dois ficam em silêncio. Só as vozes dos meninos conversando animadamente quebram esse silêncio.

- É engraçado... diz Valter, alguns segundos depois. – Na faculdade, no início... eu não gostava muito do Cláudio. Eu o achava... distante, frio... parecia arrogante... um cara sério demais pra idade dele. Eu tinha a impressão de que ele queria... botar banca por ser filho de fazendeiro rico. Isso me deixava louco de raiva. Eu tinha vontade, às vezes, de... dizer pra ele que, com dinheiro ou não, ele era tão estudante de faculdade quanto nós. Em termos de medicina, ele era tão ignorante quanto nós. Que não havia necessidade de se dar ares de... filho de rei. Você lembra. Era um dos poucos que conversava com ele. Com o tempo, eu descobri que o que eu e mais alguns colegas sentíamos era... uma tremenda inveja dele. Inveja... porque nós não tínhamos a paciência que ele tinha de ficar com os olhos grudados nos livros da biblioteca da faculdade em pleno sábado à noite. Essa atitude não se encaixava em nenhum rapaz de dezenove, vinte anos. Ou era muito nerd ou era... de desconfiar. Pra mim o Cláudio era o cara mais pedante da faculdade. Eu estava enganado, não estava?

- Redondamente, responde Miguel. – Ele era, desde o início do curso, meu melhor amigo. Eu era bem pobre quando prestei o vestibular. Minha faculdade tinha sido presente de um amigo da minha mãe. Ia ser paga por ele. Eu era um duro e, quando conheci o Cláudio, eu o convidei pra comer um sanduíche de mortadela e um refrigerante só pra comemorar e ele foi comigo. A gente foi a pé até a lanchonete porque eu não tinha carro na época e achei que ele também não tivesse. Quando voltamos... eu descobri que ele tinha um Mercedes lindo estacionado na frente da faculdade. Eu fiquei meio zangado e... perguntei por que ele não disse nada. A gente podia ter ido no carro dele. Ele disse... que não quis se exibir. Que, naquele momento, a gente era só calouro e a comemoração tinha que ser a mais simples possível. Que aquele carro não tinha nada a ver com o momento que a gente estava vivendo. Ele era... tão pobre quanto eu quando estávamos juntos. Se ele não gostava de ir às nossas farras costumeiras de final de sexta-feira ou nos sábados, era porque ele não era mesmo como nós. Ele já era casado. Nós dois éramos, logo no início da faculdade. Eu já vivia com a Lúcia na época, mas a minha ligação com ela era diferente. Ela também era estudante de faculdade e... além de mais experiente que eu... era casada com outro cara. A mulher do Cláudio terminou o colégio e parou de estudar depois que se casou com ele. O casamento deles era bem tradicional. Não era um “por enquanto”. Era casamento pra valer. Ele não poderia ser igual a gente mesmo. Mas nunca, nenhuma única vez, eu ouvi o Cláudio mencionar nada sobre ser ou não rico. Ele nunca foi pedante, nem arrogante. Ele era e é... gente. Essa doença miserável não poderia ter escolhido pessoa mais errada pra atacar...

Um novo silêncio. Agora ele é interrompido por Rodrigo que o chama:

- Miguel!

- O que foi, filho?

- A mamãe já chegou?

- Acho que não, não é, Rodrigo. Se ela tivesse chegado já teria ido falar com você. Você não acha?

- É... acho que sim... o menino diz, ponderando.

- Mas ela já deve estar chegando. Por quê?

- Ela não foi achar a mãe do Alberto?

- Ela foi procurar pela mãe do Alberto.

- Então... eu quero saber se ela já achou... E ele também. Ele disse que não quer mais ir pro orfanato. E que se você e a mamãe não quiserem mais ele aqui, que ele vai procurar... procurar quem mesmo, Alberto?

O menino não responde e permanece com os olhos fixos no carrinho em suas mãos. Ele teme que Miguel brigue com ele. Miguel olha para Valter, levanta-se e entra no quarto, aproximando-se do lugar em que Alberto está sentado. Senta-se ao lado dele e coloca a mão sobre a dele.

- Quem você vai procurar, Alberto?

- O tio Cláudio, ele responde, em voz baixa, com a voz embargada e sem levantar os olhos.

- Mas o tio Cláudio está longe, muito longe pra você ir sozinho atrás dele.

- A tia Lúcia sabe onde ele está aqui em São Paulo.

- Ele não está lá agora.

Alberto ergue os olhos, já molhados.

- E onde ele está?

- Ele está em Casa Branca.

- Ele voltou pra lá e não me levou? Esqueceu de mim?

- Alberto, ele não se esqueceu de você. É que ele... ficou doente e teve que voltar pra lá pra se tratar.

- Mas ele não é médico? - Rodrigo pergunta.

- Claro que é! - Alberto responde.

- Médico não pode ficar doente. Quem vai cuidar dele?

Miguel e Valter, encostado na porta do quarto, sorriem da inocência da observação do garoto.

RETORNO AO PARAÍSO – RETORNO...

PARTE 5

OBRIGADA POR SONHAR COMIGO!

BOA TARDE!

DEUS NOS ABENÇOE A TODOS NÓS!

Velucy
Enviado por Velucy em 20/06/2018
Código do texto: T6369398
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