QUEBRANDO BARREIRAS - RESSURREIÇÃO - PARTE 1

I - RESSURREIÇÃO

...Alguém está com problemas em algum lugar esta noite...

... O vento levou para longe todas as notícias de ontem...

Nigel Olson jogou o jornal do dia sobre o colo de Bernie e perguntou:

- Já leu?

Estavam no apartamento de Bernie, em Los Angeles. Um lugar amplo e aconchegante que ele havia escolhido para viver sozinho, já que estava apaixonado pela cidade de Los Angeles e havia se separado de Maxine Fiebelman já há quase três anos. Era Novembro de 1977, o dia seguinte do show de Elton John em Wembley, Inglaterra, que ele havia anunciado ser seu último, depois de oito anos de carreira.

Bernie, sentado no sofá com os pés sobre a mesa de centro, abriu o jornal e leu a manchete em letras grandes “Elton John dá seu último show no estádio de Wembley, Inglaterra!” O letrista deu um suspiro e olhou para Nigel com a mesma tranquilidade anterior como se não percebesse a intenção do baterista.

- Já, respondeu sério.

- Só? - perguntou Nigel, esperando complemento.

- A manhã inteira eu fiquei ouvindo isso nas FMs e na TV e, se eu não tivesse ouvido, a população inteira de Los Angeles e da América teria me telefonado ou vindo tocar minha campainha pra me avisar.

- Ele não pode levar isso a sério, cara... disse Nigel, olhando com tristeza para a manchete no jornal.

- Eu acho bom que ele leve, disse Bernie, levantando-se, ainda tranquilamente. - Quer beber alguma coisa?

A frieza do letrista deixou Nigel perplexo.

- Um pouco do tranquilizante que você tomou! Você está bem?

Bernie esboçou um leve sorriso cínico e não respondeu imediatamente. Foi até o bar, preparou duas bebidas e voltou para junto de Nigel, que havia se sentado numa poltrona. Entregou um dos copos a ele, sentou-se no mesmo lugar onde estava antes e perguntou:

- Que é que você quer que eu faça? Chore?

- Não é isso, mas pelo menos...

O letrista o interrompeu:

- Nigel, o Elton já fez esse tipo de coisa outras vezes e não cumpriu. Tem que parar com isso! Se fez isso só pra se promover de novo, vai quebrar a cara. Ele não está com essa bola toda dessa vez.

- Agora ele não tem mais você... disse Nigel quase que para si mesmo.

Tomando um gole da bebida que tinha na mão, Bernie continuou:

- A menos que ele encontre outro letrista, não vai ter como manter mais uma gracinha com a imprensa, falou esboçando um suspiro olhando para o líquido no copo. - Acho que dessa vez é sério...

Deu uma risada quase sem querer e levantou-se de novo indo até a janela e olhando para a vista do mar que ficava do outro lado da avenida em frente ao prédio. Depois ficou sério de novo.

- Não estou te entendendo, disse Nigel. - Isso quer dizer...

O letrista voltou para perto dele e sentou-se na mesinha diante de Nigel.

- Para de me olhar como se eu estivesse matando minha mãe, por favor. Eu imagino o que deve estar se passando por esta cabecinha maravilhosa, batera... mas eu já levei tanta cacetada da vida nestes últimos dois anos que o sentimento que me fazia sentir pena de quem quer que fosse simplesmente... secou.

Uma ruga de espanto apareceu na testa de Nigel que ficou sem saber o que falar.

- Eu não sei mais nem sentir pena de mim mesmo, Nigel. Se eu fizer isso... eu volto a um, dois anos atrás... que era como eu me sentia.

- Foram os melhores anos pra vocês... pelo menos profissionalmente. Eu pensei que tivesse sido uma época boa...

- Boa demais! Foi maravilhoso! Foi uma viagem com a melhor cocaína que você pode provar na vida, amigo... mas sabe o que acontece depois que você volta dessa viagem?

- Você ficar pior que antes...

- É isso aí, Bernie disse, erguendo-se e voltando para a janela. - Se eu voltar a sentir pena... ou ser bonzinho com os outros e... principalmente com o Elton, eu vou cair no velho 67 novamente e seria ridículo, já que estamos em setenta e sete.

- Não estou te pedindo para sentir pena dele nem ser bonzinho, só que... vocês são amigos quase irmãos, poxa!

- Tá, você quer que eu faça o quê?! Que vá até lá e peça pra ele não fazer isso, me candidate novamente a letrista dele como fiz com Reg Dwight e comece tudo de novo? Pois bem... Eu sinto muito, sinto tanto quanto você ou qualquer um que tenha estado na vida do Capitão Fantástico desde o Troubadour/70. Imagino como deve ter sido horrível pra ele tomar uma decisão assim, abertamente, em frente ao público dele. Só que eu não consigo ter pena disso, mesmo que eu queira. Se eu estivesse lá, no Wembley, teria sido o primeiro e o único a me levantar e aplaudir Elton John por essa decisão. Fique certo, amigo, seria o aplauso mais sincero que eu teria dado a ele em toda minha vida... como letrista e como amigo/irmão dele...

- Então ele fez bem na sua opinião?

Bernie ficou olhando para ele por alguns segundos e respondeu, balançando a cabeça afirmativamente.

Nigel respirou fundo e ficou olhando para o copo, depois, ergueu a cabeça e falou:

- Pode parecer contraditório, mas... começo a achar que você tem razão...

Bernie sorriu.

- Gente inteligente costuma se contradizer com mais frequência porque tem capacidade de pensar pra trás, além de pra frente, sabia? E você ama o Elton, apesar do que ele fez pra você e pro Dee em 75... fez e faz parte da família dele. Sabe o que é melhor praquele porra louca.

Nigel sorriu embora achasse estranho o jeito de Bernie se referir ao amigo e completou:

- Eu penso nele às vezes como fã. Eu admiro e curto o Elton demais... Estou magoado com ele sim, mas...

- Eu sei.

- E você?

Bernie baixou os olhos e ficou em silêncio olhando as pontas das botas de couro.

RESSURREIÇÃO – PARTE 1

CONTINUA...

BOM DIA!

Velucy
Enviado por Velucy em 01/07/2019
Reeditado em 02/07/2019
Código do texto: T6685624
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