Enquanto faço uma oração

Vou deixar que a poeira entre

E que tome conta da sala

Vou deixar que ela se assente

Pelos móveis, pelos talheres no escorredor

Roupas no varal e no chão

Enquanto me calo

Que as ondas se espalhem pela varanda

E molhe o jardim e o quintal

Vou obedecer ao que sua força manda

Leve a flores, os cachorros

Minha horta, minha aorta

Enquanto me ajoelho

As tardes têm trazidos as nuvens pratas

Para o altar da minha saudade

Daí tudo me espalha e nada me cata

Chova o que tiver de chover

Não vou abrir o guarda-chuva

Enquanto isso fecho os meus olhos

Vou permitir, mesmo que por enquanto

Que o punhal da maldade ou da prova

Me penetre causando meu pranto

Meu sangue irá escorrer

Depurar em plena sangria

Enquanto isso junto minhas mãos

O silêncio irá me invadir a boca desdentada

Recolherei a mim mesmo em grito

Enquanto o livro da vida se abre em páginas erradas

Vou buscar lá dentro

O que não descobri ainda do lado de fora

Enquanto faço uma oração

Vavá Borges
Enviado por Vavá Borges em 27/03/2014
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