Aos Olhos de Aya.

alguns aqui se dopam por falta do que fazer

outros pelo excesso

e outros sem motivo mesmo

ladeira abaixo, adrenalina em cima

um mar de refugiados de si mesmos

e eu que estava ilhado, tento fugir da inundação

me manter sóbrio, me manter são

nesse manicomio.

- essa camisa de força não é minha!

então me perguntam o que faço aqui

eu não consigo responder, engulo duas pilulas

e saio dando autografos pros mais chapados que eu.

mas não era pra ser assim, será que eu sou assim?

confetes, eu quero confetes pra mim

quem sabe eu desperte, ou me lembre

que não sou aquele monstro na lista dos mais procurados

e nem aquele niilista do caralho

viciado dos viciados, filha da puta sem alma

comedor de filha alheia, louco

e mal amado

esse não pode ser eu, não pode.

e mesmo sabendo disso fui convencido

fui vencido pela exaustão

e as mentiras mil vezes repetidas ecoaram

três mil vezes

e fez-se a verdade

forjada em brasa, embebida em veneno

liquefeita, injetada e absorvida. pronto.

nem ardeu, foi esquecida logo

como se fosse parte de um plano superior

um tsunami de torpor.

mas no quarto acolchoado, entre uma dose e outra

existem delirios lúcidos

de ego espatifado e espírito de calamidade

e aquela fresta de verdade

aquela fresta

pode trazer à luz o esquecido

e iluminar o fodido mais infeliz da cidade

e se conseguir forças para acreditar

aquela fresta, se tornará maior

e logo poderá atravessar e retornar

voltar a ser o que sempre foi

muito melhor talvez, aos olhos de Aya

aos olhos no espelho e aos olhos do mundo e aos olhos do todo e não mais haverá cegueira não mais haverá tortura só haverá caminho e a certeza de que não estamos sozinhos.