Navegar É Preciso. Mas Como?
Um dia construí um lindo barco com meu marido. Resolvemos morar nesse barco e deixá-lo sempre em mar tranqüilo. Ali vivíamos em paz. Nenhuma tempestade revoltava as águas. Deitávamos no convés e admirávamos as estrelas e a lua. Nenhum barômetro ou termômetro eram necessários porque a calmaria era a certeza de nossos dias.
Entretanto, uma tempestade formava-se vagarosamente em minha cabeça. Para que ela não se mostrasse, eu me recusava a olhar para dentro de mim porque sabia que ali estava a chave para que o nosso mar se transformasse.
Mas o vendaval de meus pensamentos virou minha cabeça para o lado proibido, o meu interior. Nesse momento, nosso barco começou a se agitar. Eu sabia que precisava cuidar de meu marido porque ele não sabia nadar e, assim, não poderia cair naquelas águas.
O temporal foi rápido, passou. Mas onde ele esteve latente por muitos anos ficou um vazio. Eu já não me sentia completa e agradável naquele barco tão perfeitamente construído e colocado em local tão seguro.
E nesse vazio, uma tormenta de grandes proporções eclodiu. O céu perdeu as estrelas e a lua foi encoberta por pesadas nuvens de chuva.
Raios e trovões pipocavam no céu com violência descomunal. O nosso mar foi tragado por ondas grandes e fortes, sacodindo nosso barco, pondo em desordem tudo aquilo que calma e persistentemente nós dois construíramos.
E essa tormenta se recusa a passar. E agora, em nossa embarcação, não sei se procuro para mim um porto seguro e fecho os olhos para as perdas ou se me agarro ao meu marido e me deixo ser lançada junto com ele nas águas rebeldes.
Pode ser que o porto pensado seguro não seja tão seguro assim, seja uma ilusão. Pode ser que ao me lançar ao mar junto com meu marido, sejamos tragados pelas ondas e pelo escuro. Pode ser que aprendamos juntos a nadar, com paciência e persistência, e encontremos uma ilha. Nosso barco já estará destruído, mas continuaremos juntos num novo recomeçar.
Navegar é preciso. Mas como? Que decisão tomar?