Para os Adultos no Espírito

A comunicação entre os Seres Humanos se faz por meio das palavras, verbalmente ou por escrito, também através de sinais e imagens. No entanto, qualquer que seja a forma de comunicação utilizada, sempre sobra o espaço para a interpretação, que submetida a várias pessoas, resulta em várias interpretações, o que indica que não dispomos de uma infalível maneira de nos comunicarmos. Portanto, nossa comunicação é sempre imperfeita.

Além dessa imperfeição, a situação poderá ser facilmente agravada, se deliberadamente, o comunicador desejar se expressar de forma elaborada, com a intenção de dificultar a correta interpretação de uma determinada comunicação, na expectativa de que apenas alguns tipos, subjetiva e previamente escolhidos, possam alcançar o verdadeiro sentido da comunicação. Mais elaboradamente, surgiram as metáforas, parábolas, símbolos, códigos secretos, mensagens cifradas, etc.

Contudo, o expediente da deliberada intenção de dificultar a interpretação da comunicação não é exclusivo da esfera racional, pois a própria Bíblia dele se utiliza, e até Cristo disse que se utilizava de parábolas, para direcionar o conhecimento dos mistérios do reino dos céus, conforme Mateus 13:10 a 17. Isso indica que devemos nos aprofundar no exame de quaisquer tipos de comunicações, para obtermos a melhor e mais correta interpretação possível, como alicerce para firmar as nossas convicções.

Nesse sentido, o Apóstolo Paulo, o mais fecundo dos Profetas evangelistas, discorre com veemência sobre a necessidade de ultrapassar os princípios elementares da palavra de Deus, como se vê nos textos seguintes.

Hebreus 5:12,a14 e 6:1,2 – De fato, embora já deveríeis ser mestres agora, ainda precisais que alguém vos ensine de novo os princípios elementares da palavra de Deus, sendo que vos tornastes necessitados de leite, e não de alimento sólido. Qualquer pessoa que se alimenta de leite é inexperiente na palavra da justiça, pois é criança. Mas o alimento sólido é para os adultos que, pela prática, têm suas faculdades morais exercitadas para discernir tanto o bem como o mal. Assim, deixando os aspectos elementares do ensino de Cristo, prossigamos para o aperfeiçoamento, não lançando de novo o fundamento do arrependimento de obras mortas e da fé em Deus, o ensino sobre batismos, imposição de mãos, sobre a ressurreição dos mortos e o juízo eterno.

Efésios 4:12a15 – (...) tendo em vista o aperfeiçoamento dos santos para a obra do ministério e para a edificação do corpo de Cristo; até que todos nós cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, ao estado de homem feito, à medida da estatura da plenitude de Cristo; para que não sejamos mais como crianças, inconstantes, levados ao redor por todo vento de doutrina, pela mentira dos homens, pela sua astúcia na invenção do erro; pelo contrário, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça; Cristo.

Colossenses 2:16 – Assim, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa de dias de festa, ou de lua nova, ou de sábados, que são sombras das coisas que haveriam de vir; mas a realidade é Cristo.

Gálatas 4:9a11 – (...) agora, porém, que já conheceis a Deus, ou melhor, sendo conhecidos por ele, como podeis voltar para esses princípios elementares, fracos e pobres, aos quais de novo quereis servir? Guardais dias, meses, tempos e anos. Temo que eu talvez tenha trabalhado inutilmente para convosco.

Todos conhecem as velhas histórias infantis que contamos aos nossos filhos pequenos e aos nossos netos, registradas em muitos livretos do gênero, assim como as diversas fábulas que povoaram nossas imaginações. É claro que após a infância aprendemos a entender o significado dessas histórias e fábulas, geralmente lições de vida que têm utilidade prática na nossa existência. Ocorre que também para os adultos existem histórias simbólicas, fábulas e genealogias, sob as quais existe um sentido oculto, ao qual muitos não conseguem ter acesso. A Bíblia é quase que inteiramente elaborada sobre uma base simbólica, sobre a qual os Profetas alcançaram compreensões parciais, conforme os dons que lhes foram conferidos, compatíveis com as suas respectivas potencialidades.

I Coríntios 13:9 – Porque parcialmente conhecemos e parcialmente profetizamos.

Além desses Profetas, Jacob Boehme, o maior Teósofo dos últimos quatro séculos, um modesto sapateiro alemão, também foi contemplado com uma profunda compreensão sobre a Bíblia, traduzida nos seus livros, de grande repercussão no Ocidente. Vejamos alguns trechos do seu livro “Os Três Princípios da Essência Divina”, (Editora Polar) os quais são desconcertantes com relação ao ensino das denominações teológicas, que interpretam literalmente o conteúdo da Bíblia.

Sobre o “nascimento” de Jesus Cristo: (pag. 325)

“(...) O leitor não deve entender aqui que a Palavra para a Encarnação veio então pela primeira vez aqui embaixo, a partir do mais alto do Céu além das estrelas, para tornar-se homem, como o mundo ensina em sua cegueira. Não! Quem se tornou homem foi a Palavra que Deus disse a Adão e Eva no Paraíso, a que se referia ao quebrador da serpente. Essa Palavra se representou [ou imprimiu] nas portas da luz da vida, subsistindo interiormente no centrum das portas do céu e esperando perceptivelmente na mente dos homens santos até essa época. Essa Palavra divina entrou de novo na Virgem da Sabedoria divina [ou Sofia], que fora colocada junto do Verbo na alma de Adão, para ser uma Luz e foi dada ao Verbo como auxiliadora”.

Sobre a “Mãe” de Jesus e os “santos”: [pag. 336 e 434]

“(...) Quem enviarás a ele [Deus] para reconciliá-lo contigo? A Mãe de Jesus? Oh, não! Homem, isso não servirá para nada. Ele não absolverá tua maldade mediante tuas prostrações falsas; ele não conhece as cartas que lhe envias pelos santos, que estão em repouso diante dele, no elemento celeste”.

“(...) Se quisermos agora considerar sua preciosa encarnação, devemos abrir bem os olhos do nosso espírito e não pensar tão terrenamente como atualmente se faz em Babel. Devemos considerar bem, como Deus tornou-se homem; pois as Escrituras dizem que ele foi concebido sem pecado e engendrado de uma virgem pura. Querida mente, pensa que espécie de virgem era: pois tudo o que é nascido da carne e do sangue deste mundo é impuro, e nenhuma virgem pura pode ser engendrada deste sangue e desta carne de corrupção. A queda de Adão quebrou tudo: tudo está sob o pecado e nenhuma virgem pura é engendrada da semente do homem. E, no entanto, esse Cristo foi concebido sem pecado e engendrado de uma Virgem pura. Aqui, os eruditos das escolas deste mundo se calam, e o aluno nascido de Deus avança para ensinar sobre esse nascimento. Pois o espírito deste mundo não conhece [ou sabe] nada, além disso. Para ele isso é uma loucura; e, se ele vai mais longe, então está apenas em Babel: em sua própria razão. Assim, estabelecemos aqui, conforme nosso conhecimento, que a Virgem pura e casta na qual Deus foi engendrado [ou nasceu], é a Virgem pura e casta [que está] diante de Deus, e é uma Virgem eterna [a Sofia]. Antes que o Céu e a Terra fossem criados, ela era uma Virgem, e, além disso, era inteiramente pura, sem a mínima mácula. E essa pura e casta Virgem de Deus, colocou-se em Maria, quando ela [Maria] [foi criaturizada corporalmente] ou se encarnou, e seu “novo homem” esteve no elemento santo de Deus. Por isso, ela foi bendita entre todas as mulheres e o Senhor estava com ela, como o anjo disse”.

Estamos no século XXI, com o extraordinário avanço científico e tecnológico alcançado pela Humanidade na esfera da racionalidade. Jacob Boehme (1575-1624) e os Profetas primitivos deixaram-nos muitos ensinamentos na esfera espiritual, mas nesta os avanços não são tão significativos, apesar de decorrido tanto tempo, talvez pela ação, por longo tempo também, de forças poderosas, da Terra mesmo, que impediram e que continuam impedindo uma evolução espiritual compatível, mantendo-nos na mesma situação que deu origem às queixas do Apóstolo Paulo.

Contudo, não devemos nos esquecer de que as responsabilidades, quanto ao empenho para evoluir, tanto na racionalidade como na espiritualidade, são individuais, portanto, de nossa inteira competência. No tocante ao desenvolvimento espiritual, é claro que Deus não necessita de intermediários, e através de Cristo e do Espírito Santo, todos, potencialmente, com sua efetiva dedicação, são candidatos a ter acesso aos conhecimentos espirituais, através do novo nascimento. Deus é bastante paciente, mas envia um recado:

Atos 17:30,31 – Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, e em todo lugar, que se arrependam; porquanto tem determinado um dia em que com justiça há de julgar o mundo, por meio do varão que destinou; e disso deu certeza a todos, ressuscitando-o dos mortos.

Na esfera racional temos os nossos objetivos. Para atingi-los nos esforçamos, trabalhamos duro e estudamos exaustivamente nas escolas, desenvolvendo e aprimorando as nossas vocações. O prêmio está nas conquistas materiais e numa vida mais confortável, com a satisfação da maior parte possível dos nossos caprichos.

Na esfera espiritual, no entanto, as coisas são mais complexas. Inicialmente é preciso acreditar na existência dessa esfera, que pressupõe uma sobrevida numa materialidade intangível e iluminada, sem que para isso haja uma concreta comprovação, nos termos exigidos pela razão mais radical. A seguir, em se acreditando, está a exigência de um estilo de vida adequado, com rígidos preceitos de boa conduta ética e moral, com efetiva inclinação para o bem, exercitando o amor fraterno para com os semelhantes, colocando a evolução material num plano secundário, enfatizando e priorizando o plano espiritual, pois o objetivo maior transcende os anseios e limites da humanidade, repousando na vida eterna em Cristo. Não se pode adotar o sistema do ciclotímico: entra e sai, conforme as suas circunstâncias, como fazem os escribas e fariseus hipócritas: não entram e não deixam entrar os que desejam entrar. (Mateus 23:13)

Como se observa, não é bastante, simplesmente acreditar ou ter fé. É necessário vivenciar essa fé no cotidiano, atento inclusive para os detalhes, cabendo aos intelectos mais exigentes, estudar a fundo todas as circunstâncias da espiritualidade, como a Bíblia e a literatura inerente, para absorver a profundidade das inspirações espirituais dos Profetas e crescer espiritualmente, até onde lhes permitirem as suas potencialidades espirituais, desejando, sobretudo, obter a máxima concessão: o novo nascimento e o acesso aos conhecimentos de Deus, ou à Theosophia: para nós, Seres Humanos, simplesmente, o ponto mais alto, o “topo da montanha espiritual”.

Resta-nos conjecturar, se já não passou da hora de deixarmos o leite, como alimento espiritual, passando para o alimento sólido para os adultos no espírito, deixando de perder tempo com as histórias, fábulas e genealogias sem fim. (I Timóteo 1:3,4 / II Timóteo 4:1 a 5 / II Pedro 1:16 / Tito 1:14 e 3:9 / ), e com as “escolas infantis”, cansativas repetidoras dos princípios elementares da Palavra de Deus e de inócuas solenidades teatrais, cujas “escolas” se apresentam como intermediárias entre Deus e os homens, cobrando pedágio no suposto caminho para o céu. É tempo de “acordar”, exercendo a liberdade e a independência do verdadeiro Cristão, para se entender diretamente com o Pai, através do Filho, na unção do Espírito Santo. Sucesso aos “Alpinistas”!