Saboreando um Martini Dentro de Mim Mesma

O amor era um porre e meu coração era um bar lotado. Alguns casais trancados no banheiro, aos gritos. Eu estava num canto, saboreando um martini dentro de mim mesma. Bêbada. Um rapaz se joga no banco ao meu lado.

— Mas que diabos — murmuro.

— Sozinha?

— Nunca.

— Namorado?

— Demônios e insônia.

O rapaz me olha assombrado, recolhe o drinque e cambaleia até outra mesa. Ouço uma voz macia vinda de trás de mim.

— Sempre tão louca.

Olho em direção a voz e lá está meu arrependimento.

— Não quero conversar.

— Você nunca quer. — Ele pula para o banco ao meu lado.— Parecia um bom partido. Você só dispensa bons homens.

— Grandes merdas. - Resmunguei.

— Do que quer relembrar hoje? Eu vim te amargurar.

Virei o resto do martini, sentindo o álcool rasgar minha garganta.

Uma mulher com um batom vermelho sentou-se em minha frente. Tinha uma bebida azul fumegante nas mãos. Era a ganância.

— Nós temos um mundo para ganhar lá fora e você fica ouvindo esse imbecil.

Não respondi, estava cansada.

— Aquele sapato caro ainda está na vitrine e aquele rapaz do outro lado ainda está te olhando.

Pedi mais um drinque ao garçom, dessa vez vodka pura.

— Vocês deveriam parar de insistência. Não vou sair.

A ganância alisou meu rosto com cuidado.

— Ele sequer está olhando para você garotinha.

Do outro lado do bar dava pra ver o amor dividindo um pote de amendoim com outra pessoa. Eu estava morrendo de medo. Pediria algo novo. Chamei o garçom mais próximo e pedi uma taça do meu próprio sangue. Eu tomaria coragem de enfrentar o amor de cara. O arrependimento gargalhou alto.

— Você já foi tantas vezes para cama com o prazer que o amor vai sentir é nojo.

Eu não me importava. Estava cansada de nunca correr o risco. Virei a vodka e logo atrás a taça de vermelho vivo. Me pus de pé no saguão. Enxuguei a boca com a manga da blusa. Respirei fundo e caminhei em passos largos até o amor. O caminho parecia eterno e a cada passo as luzes pareciam falhar. As flores no balcão secaram e uma grossa nuvem circulava pelo assoalho. Todos ficaram em câmera lenta, então a nuvem se materializou em um corpo de terno fino.

— Saia do meu caminho. — Berrei.

— Você tem medo do amor. — O medo sussurou em meu ouvido.