Jiminy Cricket

Venho perguntar o que aconteceu com você? Ei pequeno menino, o que fizeram a você que matou e devastou a sua consciência e hoje ela não discute mais, é só silencio.

Quem te feriu tão gravemente a ponto de você cauterizar, amortecer, congelar, petrificar e assassinar a tua consciência? Quem virou as costas para o misero bambino a ponto de você desacreditar nos conselhos que as pessoas te dão? Seu afeto ficou embotado ainda tão jovem? Como Évariste Galois quando faleceu num duelo de amor aos 20 anos. Quem o abandonou no meio do caminho assim moço, com as mãos e os pés amarrados e amordaçado e hoje você veste essa armadura que asfixia a tua consciência? Sua mãe o abandonou? Não se assuste rapazinho, a mãe de Emil Cioran uma vez disse a ele que se soubesse que seria tão infeliz, teria o abortado...

Ei, vem cá, o que é esse sangue no seu rosto? Por que essa cicatriz perto da boca? Espera... eu conheço você... Quem diz que isso que você passou não transforma o modo de ver as coisas é porque não entende nada sobre esse mundo cru e nu que você vive, depois da excisão de pele...

Jiminy Cricket é o doce e sábio locustídeo , personagem de Carlo Collodi, o pequeno grilo com seu guarda-chuva que é a consciência, o super ego, do menino travesso e feito de madeira que de santo não tem nada, na história original escrita no Jornal infantil Per I bambini, não há final feliz, Jiminy aconselha Pinóquio, o estimula a ser alguém, a estudar, coloca juízo em sua cabeça, afinal é para isso que serve a consciência, mas o menino teimoso como toda a criança que despreza o adulto que sabe mais que ela ignora, o psicanalista alemão Erik Erikson dizia que o fato da consciência humana permanecer parcialmente infantil por toda a vida é o amago da tragédia humana...

Pinóquio ignorou os conselhos preciosos de Jiminy Cricket e em um surto de fúria matou Jiminy com um martelo... O boneco de madeira sem remorso algum continuou mentindo, enganando, fugindo de casa, fazendo seu pai sofrer, não aprendeu nada com as lições de vida, envergonhou seu pai e se desvirtuou, no fim, Pinóquio conhece a raposa e o gato, foi enganado, lhe roubaram e o enforcaram em uma arvore. Esse foi o preço por não dar crédito a sua consciência.

Volto a perguntar, o que levou você a matar a sua consciência?

Aqueles que reconhecem a voz de sua própria consciência normalmente conhecem a voz da justiça, já dizia Alexander Soljinítsin, a consciência é inconsciente de si mesma, por isso alguns obedecem cegamente, é o que indica Clarice Lispector, no entanto Germaine Staël dizia que a consciência é uma pequena lanterna que a solidão acende a noite, as vezes as pessoas apagam para a vida inteira, é amargo saber que sobre todos os infortúnios da humanidade temos consciência, porém não temos o controle sobre quase nada, essa é a ótica de Heródoto de Halicarnasso e a consciência infeliz de Hegel. Segundo Escoto Erigena, é da natureza humana estar nas trevas, mas ela pode ser iluminada e conduzida pela razão, a consciência.

Há pessoas que não há mais dialogo, não há mais dialética entre o indivíduo e sua consciência e não importa o preço que paguem, nunca entenderão, foram castrados pelo ambiente caótico e se transformaram em constelações perdidas. O remorso é a única dor da alma que nem a reflexão e nem o tempo atenuam.

“Você está com medo de mim! No entanto, não sou realmente mau. Me ame e você verá, tudo o que eu queria era ser amado por mim mesmo” (escrito de Gaston Leroux em O Fantasma da Ópera)

Eden Mendes
Enviado por Eden Mendes em 16/12/2018
Reeditado em 20/12/2018
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