Depois que chorei a primeira vez, não parei mais.

Foi tardio

porque eu calava

Silêncio

muito bem empilhado

Tirava do estojo

material

sem ver

e empilhava

borracha, caneta, apontador, régua, tesoura... Vários de cada, vindos dos colegas ao redor

Empilhava

em silêncio

Foi tardio

porque eu mentia

Não era bem mentira

Mas não era verdade

Numa altura da conversa

sem ver

mentia

horas, direção, razão, causos, passados, fofocas... Até o meu nome, para os colegas ao redor

Empilhava

mentiras

Foi num filme

de criança

Foi

tardiamente que

empilhando

e empilhando

e empilhando

desmoronei

Aprendi a sentir

a encarar

a chorar

tardiamente

Empilhava tudo

para desmoronar

Me empilhava todo

para me desabar

Parei de mentir

quando aprendi a sentir

dores

alegrias

amores

tristezas

tédios

excitações

Não calava

apesar do silêncio

pulsava sentimento

Aprendi a morrer

dentro de mim

Olhando para o nada,

em silêncio

para que

de forma triunfal

ressuscitasse

De mim para eu mesmo

Empilhava meus milagres

para ninguém ver

Sentindo, em silêncio

Empilhava

todos os choros

que demorei chorar