A casa da minha avó

A casa de minha avó era um terreno situado numa esquina de uma rua de barro. Um ponto de referência. Um local construído com o fruto do trabalho.

Era um lar.

E o conceito de lar se estende conforme a palavra busca se harmonizar com a intenção.

Esse lar ia além da descrição física e trivial, sem emoção.

Esse lar possuía significados.

Era o coração dela, onde sempre cabia mais amor.

Era a mesa arrumada, com o café quentinho na xícara, um bolinho, um pãozinho, até no sabor do geladinho especial cuja receita só ela sabia.

Era no abraço caloroso e contente de quem vestia as melhores roupas e abria o sorriso mais bonito para dizer "entra, fica à vontade, não repare a bagunça", quando tudo estava sempre organizado.

Era para alguns um almoço de domingo, sentar e ouvir discos, para outros, ver álbuns de fotografias e ouvir as histórias que eram mais divertidas quando contadas por ela.

Era na generosidade expressada e desinteressada que também se conhecia o sentido de olhar por aqueles que mais necessitam de um pedaço de pão, algo para vestir ou calçar, uma palavra amiga.

Era no doce e tradicional aceno em frente ao portão, até a silhueta de vista perder.

O carro dobrava a esquina, subindo, e no farfalhar das árvores pelo caminho, as melhores recordações eram discutidas. Uma tarde nunca era o bastante.

E pode ser difícil chegar ao fim dessas considerações e saber que nunca mais haverá um telefonema dela nos aniversários e no natal, que esse percurso que por tanto tempo nos conduziu até aquele lugar será apenas uma recordação.

O terreno sem a presença dela é apenas um imóvel como outro qualquer. O amor dela era o laço que unia a todos, uma estrutura inabalável, mesmo quando o inevitável se dá e não se sente o chão sobre os pés.

Na partida, levando um pouco de cada um de nós, não acenou, porque adeus é uma palavra muito forte para se dizer, quem sabe um suave "até a vista".

O portão se fechou. Nas estrelas desenham-se as lembranças dos tempos de criança, hoje apenas vagos vislumbres, e nos sonhos esse lar já teve tantas formas. 

Agora é de saudade.

Marisol Luz (Mary)
Enviado por Marisol Luz (Mary) em 14/06/2021
Reeditado em 14/06/2021
Código do texto: T7278312
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.