Saco de ossos
Bloqueio Criativo! Está aí, uma condição que assombra qualquer literato. A ponto até do impertinente fenômeno servir de inspiração para compor novas histórias, naturalmente, apenas quando os escritores não se veem acometidos pela efêmera perda da habilidade, alvejados em seu âmago pelo decíduo finamento das palavras. Na aposta de um compêndio, bem no estilo meia tigela, “Saco de Ossos” até pode ser tipificado como a inflexível batalha de um lúgubre autor, precisando lidar com a morte precoce da esposa em meio a um bloqueio criativo que parece inacabável.
No livro, lançado por Stephen King no final da década de 90, os conflitos são acentuados o bastante para sequestrar o leitor, empedernido diante de um terror com pitada sobrenatural, apinhado de mistério, paixão e maldições seculares. Um dos aspectos, intrínseco a “Saco de Ossos”, centra-se muito mais em suas nuances de desenvolução do que propriamente na trama, que por si só empilha singularidades.
“Saco de Ossos”, um título metafórico e visceral - afinal não somos nada além de carcaças que servem como verdadeiras bolsas para acondicionar um amontoado de ossos -, desponta como um irrecusável convite para, na companhia de um autor extremado, passar uma temporada em uma casa de verão. O único problema é que a bela e vetusta construção, erigida defronte ao lago, é um verdadeiro abrigo para fantasmas rancorosos. Ou, talvez, seja esse o maior atrativo. Que tal descobrirmos juntos?
Saco de Ossos
Com narração em primeira pessoa, na voz do protagonista Michael Noonan, o romance é enredado por referências dos anos 80 e, especialmente, da década de 90, período o qual foi germinado. Com mais de 550 páginas em sua composição, “Saco de Ossos” eclode como uma típica história que ostenta uma casa mal-assombrada como pano de fundo, rodeada por um balaio de acontecimentos epopeicos.
Todo o enigma, centrado na estranha morada, além de uma série de eventos atrelados a luta pela guarda de uma criança, faz parte dos acontecimentos mais preponderantes da trama. É bem verdade: em algumas passagens a narrativa parece percorrer um estranho limbo. Embarca em uma zona um tanto arrastada, marcada por alguns acontecimentos um tanto confusos e até controversos.
Para a sorte, logo o autor retoma as rédeas da narrativa e a direciona aos melhores caminhos. Mais do que mentalizar com exatidão toda a estética da comunidade, o mestre do terror consegue estampar suas ideias no papel de maneira notável, sem falar no desenvolvimento de personagens atempados, diálogos bem intercalados, e a precisão narrativa habitual.
Histórias de fantasmas são sempre agradáveis de se ler e até escrever, mas esbarram em alguns desafios, como o de tentar idear um enredo minimamente novo, já que acaba sendo fácil cair na chamada recorrência e no fim entregar uma obra previsível, nada além de um reflexo do que se tem por aí em abundância.
“Saco de Ossos”, talvez, possa não ser necessariamente uma clara demonstração de inventabilidade, mas possui originalidade. Como uma espiral, as lacunas lançadas no transcorrer do livro desbundam o leitor, e como um disparo certeiro, a cada página o atiça mais, até torná-lo um pobre zumbi sequioso por respostas.
Nos momentos finais, o leitor se dá conta de que todo o dualismo, acerca do título do livro, de fato evidenciava uma impressão deveras assertiva. Com uma vastidão de temáticas, os eventos expostos no auge de seu encadeamento configuram uma trama bem-ajambrada. Capaz de fintar a previsibilidade, quando parecia que contra ela iria se chocar, e se despede do leitor com um desfecho capaz até de deixá-lo, literalmente, incrédulo.