Da escolha do par perfeito.

Da escolha do par perfeito.

Uma das coisas que mais permeia os pensamentos que rodam as mentes da população é a busca do par perfeito, ou o mais ideal possível. Esse pensamento pode se manifestar de diversas formas e tomar rumos interessantes se analisado, mas na maioria das vezes é tão medíocre que vemos o mundo como um mar da mais e profunda previsibilidade.

Comecemos com a natureza, ela consegue tanto criar formas de vida tão complexas e diversas quanto cagar e andar para se vão ser aniquiladas ou não. É fantástico o funcionamento do organismo pluricelular complexo. Um elefante é tão complexo em seu mecanismo de funcionamento que se analisarmos toda a fisiologia e anatomia dele chegaremos à conclusão que só algo muito poderoso poderia ter criado aquilo, conjuntamente com todos os outros organismos em nosso mundo. Aglutinamos, então, a idéia que a natureza destrói elefantes, hienas, cavalos, bois, milhões de insetos, e toda a sorte de vida diariamente sem ligar o mínimo para cada exemplar, o que sobrevive é a espécie. Cada pedaço dela é que fará a idéia do todo e dará algum sentido a ser elefante, leão ou ser humano. Essa aleatoriedade e previsibilidade dão a natureza ao mesmo tempo um pedestal e uma mediocridade.

Com o ser humano não deixa de ser diferente. A única diferença é que temos consciência desse processo. Enquanto a espécie humana é a única que se manterá viva por tempos indeterminados cada um de nós, simples pedaços perdidos e nascidos a esmo no mundo nada significamos para a natureza e para o todo da existência.

Essa idéia vem de Schopenhauer, pensador dito pessimista. Mas essa idéia é muito válida se aplicamos em nosso dia a dia e vemos quantas pessoas se acham as únicas e mais perfeitas formas de vida do planeta. Quando todos os seres humanos são únicos, a unicidade deixa de ser uma coisa exclusiva e passa a ser medíocre. Por todos sermos diferentes a diferença não importa e passa a ser ridiculamente simples e nem um pouco pode-se pensar que é uma grande magia. Somos todos únicos e por isso ninguém é diferente do outro na qualidade primária.

Por nos sentirmos mais perfeitos e predestinados seres da face do planeta aliamos esse sentimento ao nosso instinto de reprodução que buscando com certo critérios, por vezes muito pouco criteriosos (pois por mais rígidos que sejam os critérios que temos para escolher nosso par há uma idéia chamada paixão que derruba as mais ferrenhas barreiras do critério, essa paixão acaba com qualquer racionalidade possível) um par que vá evoluir a espécie. Passar seus gens conjuntamente com os gens do seu par, o mais perfeito possível é a idéia que permeia o lado instintivo humano.

Garantir a sobrevivência da espécie é o fim último de cada relacionamento. Só que estamos em uma fase planetária em que seis bilhões de seres se amontoam de forma desordenada e caótica ao redor do globo e garantir a sobrevivência de nossa espécie não significa encher o mundo com mais seis bilhões de humanos e sim deixar que a espécie consiga sobreviver o maior tempo possível.

Com avançadas técnicas de plantio, cultivo, desenvolvimento artificial, medicina de ultima geração a população menos preparada para enfrentar desafios e sobreviver vai conseguindo se virar e se reproduzir. Levando esse fato em consideração estamos indo na direção oposta a da evolução. Quando garantimos a sobrevivência de seres menos preparados garantimos que exemplares defeituosos e fadados a morte passem seu genes a frente.

Logicamente que pela ética já arraigada em nossos pensamentos cada vida humana tem seu valor e potencial, cada um de nós é válido e necessário. Mas nesse ponto voltamos ao início do texto e vemos que para a espécie humana os exemplares, os únicos, são irrelevantes, são pífios corpos e mentes que se arriscam no que chamamos de vida.

A escolha do par perfeito só teria objetivo se toda a humanidade fosse centrada e rumasse em direção ao objetivo de evolução tácita da espécie, mas como isso passa longe do que vemos diariamente acontecer o sentido de buscar um par perfeito só tem reflexos na idéia espiritual da coisa.

Aqui requer uma diminuição no ritmo do texto a fim de explicar outro detalhe importante para o esclarecimento do texto.

A consciência humana só existe porque existe o físico. O cérebro e todo o conjunto neural existe a priori de nossa consciência. Que só se manifesta e existe quando o corpo orgânico vive. Não tendo como sobreviver fora desse aparato. Seria muita pretensão achar que nossa consciência independe do corpo e pode sobreviver sozinha.

Levamos mais ainda o pensamento para o lado espiritual de se escolher um par perfeito.

O que se busca ao tentar encontrar a cara metade é felicidade, realização e uma penca de outras metas que na maioria das vezes é única e pessoal. Mas uma coisa continua a não querer ser esquecida, a reprodução. Procuramos um par para nos reproduzirmos. Se não houvesse idéia de ter filhos e/ou constituir uma família creio que não haveria uma busca por esse complemento do jeito que vemos.

Há toda uma ânsia de relacionamentos onde aparentemente não existe um fim para tal, já que temos por aí tantos encontros sociais massivos onde pessoas se satisfazem fisicamente trocando carícias ou propriamente fazendo sexo e logo após completo esse objetivo elas voltam para suas casas, sem se preocupar muito com se esbarraram com o par perfeito ou não.

Só na idéia de relacionamento fixo para fim de procriação e família vemos essa preocupação espiritual do ser contemporâneo.

E como não há objetivo maior em ter filhos do que o simples fato de tê-los a coisa começa a se desestruturar. Pois se já não se tem um objetivo para a espécie humana o único objetivo de constituir família e procriar é garantir a sobrevivência da espécie.

Um ciclo meio vazio de significado e bem natural, bem biológico, totalmente instintivo. Levando a concluir-se que o homem ainda é um animal só que consciente de algumas inquietações socialmente construídas, mas nunca em grau mais elevado que os outros animais no planeta.

Não há objetivo mor da existência da espécie humana na Terra a não ser a própria sobrevivência dela. O que leva a crer que buscar o par perfeito é um tanto inútil e infrutífero do ponto de vista da espécie na Terra, valendo unicamente do ponto de vista pessoal de cada ser no planeta que é inserido em um meio cultural que faz o sujeito ansiar por esse achado. Que muitas vezes faz a máquina econômica funcionar a todo vapor, pois para se encontrar alguém, se entreter e se reproduzir gasta-se e movimenta-se economicamente o mundo.

O par perfeito não existe, o homem não é capaz de amar uma mulher a vida inteira, ele ama a idéia de mulher que quanto se concretiza no relacionamento logo cai abaixo e fica como que longe do ideal imaginado. Se o homem ansiasse amar um ser, conhecê-lo e saber que tudo vai mudar com o tempo e se acostumar a essa idéia essa busca pela cara metade seria posta a baixo.

Pela falta de objetivo da espécie humana e por toda a inutilidade aparente desse processo que não se manifesta nem em buscar uma raça melhor nem garantir efetivamente a sobrevivência da espécie o relacionamento hoje em dia é instintivo, disfarçado de apetrechos modernos, dando-nos a idéia de que somos melhores que os outros animais.

Temos que conscientizarmos de que somos iguais a todos e quaisquer animais da Terra e ao acreditarmos nessa verdade única saber que toda nossa vida não passa de mera manipulação comercial do inicio ao fim.

Mas se aqueles que preferem ainda pensar no próprio umbigo e achar que cada vida humana é válida e indispensável e ignorar que no todo como espécie humana estamos vagando sem rumo e destruindo nosso planeta espero que vivam felizes enquanto puderem.

leandroDiniz
Enviado por leandroDiniz em 16/01/2006
Código do texto: T99324
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