BURACO NEGRO
2015-Facebook me lembrou hoje.
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Aquele espectro vacante
teimava, me perseguia
Num súbito rompante
Sob uma manta difusa
De forma inconstante, arredia.
Não em plena luz, nem na umbra
Deixando minha mente confusa.
Aparecia do nada e no nada se ia,
Em baldio interstício do atento.
Sempre à noite, na penumbra,
E em incerto momento,
Invadia meu quarto. Nas vias, estradas,
A porta de meu carro abria.
No banco vizinho sentava
E dali logo saía.
Por vezes fazia-me sinais
os quais não compreendia.
Uma vez, sentado à cama, chegou, sem mais
Eu olhava para fora do quarto.
Entrou, fitou-me, sinalizou.
Somente um vulto ! Sem forma ou feição, sem retrato.
Com um gesto o chamei.
Veio. À minha frente estagnou.
Por um momento hesitei
Convidei-o a sentar-se a meu lado.
Assim o fez.
A noite era escura. Da rua algum lume adentrou
Tênue, sobre meu dorso acostou.
Permanecia parado.
Numa espontânea sensatez,
Estreitei os olhos e (por instantes) assim fiquei.
E finalmente o vi, por completo.
Entre intervalos e mundos desatinei
Quando defini aquele ser circunspeto.
Era eu, mirando a mim
Sem sentimento, audição, sem fala.
Havia algo estranho naquilo, sim !
Movimentos sem simetria.
Mas ali estava: eu, comigo mesmo. Um eu,
outro eu, desafio ?
Não sei. Eu só olhava, com os ouvidos de quem cala.
Encorajado, não sei se lento ou de estralo,
E sem saber se conseguiria
Fiz mímica menção de tocá-lo.
Acompanhou-me, como em ensaiada liturgia.
E da fusão de corpo e anticorpo
Restou o mais absoluto vazio.