Pai Nosso dos Esquecidos

Pai nosso que estais no céu,

aqui embaixo reina o desengano.

O teu nome é profanado

em cada pregação vendida,

em cada moeda consagrada

ao altar do capital.

O teu reino está sendo leiloado,

lote por lote,

oração por oração,

até que só reste o deserto

em nossos olhos.

Estão nos explorando,

e juram que é tua vontade.

Chamam de cruz o fardo que nos impõem,

e de fé a resignação do oprimido.

O pão nosso de cada dia

é dia sim, dia não —

e às vezes nem isso.

As mesas fartas são para os escolhidos

do mercado,

não do céu.

Ninguém perdoa nossas dívidas,

mas quem nos persegue

são nossos devedores.

Deixe-nos a sós com as tentações,

pois são as únicas que nos lembram

que ainda estamos vivos.

E livra-nos, por favor,

dos homens de bem,

porque deles é o poder,

e a força,

e a glória —

que era tua.

Eles roubaram.

Para sempre.