PRECE
Dou vivas em homenagem aos ossos que o mau agouro roeu.
Talvez seja este o preço de uma pseudo-liberdade
Prometida pela cáustica nobreza do ser.
- e isso dói-
Como a infecção que estraçalha o intestino dos corpos doentes
Anjos que choram e sangram fel, vinagre e enxofre
Repousam em pontas de cruzes negras e ferro retorcido
Arrependidos em leito de sombras.
Observo o mar da devassidão humana
Turvo e ameno, como o próprio fingimento,
E ainda assim dou vivas ao homem
E a quem soprou-lhe os nasais orifícios.
Somos lama podre e disforme, sim, é isto que somos
Nas babilônicas catedrais do muco,
Ajoelhamos e clamamos a uma entidade imaginária
Pela paz refletida nas unhas de nossos ancestrais.
- e isso cansa –
O fogo infernal, a auréola divina
A deficiência do aleijado e o povo perfeito de Hitler;
VIDA. FRIA. SINA.
A peste ignorante dos últimos dias,
Vandalizou a rima certa
E o canto agora é pegajoso, como o pegajoso sangue menstrual.
Neste pergaminho da existência,
Faço uma prece sem religião
Pois ontem, ao ver meu amor morrer,
Joguei minha bíblia no chão.