O Menino e o Deserto

O menino cultivava flores em seu Elísios,

Cultivava como o primeiro amor,

Mas com apenas um piscar de cílios,

Conheceu o pior tipo de dor.

Suas flores morreram e sem tonalidade,

Por que isso é verdade?

Irava o punho contra os céus e foi se,

Mesmo que ele próprio segurava a foice.

Tentava encarar o sol da manhã por ser o mais calmo,

Fazia lágrimas cair contra a luz por ser o seu alvo,

Mas seu pé pisou diferente em um momento certo,

Ao descobrir-se da Ira percebeu-se em deserto.

Seu pé pisava almofadado,

Tinha um olhar tão desesperado,

No seu primeiro dia era puro calor,

Pois ainda conseguia sentir desamor.

Deixava aos poucos de ser buzarate,

Pensava caminhar para o próprio abate,

Era o silencioso debate,

De um derrotado procurando empate.

Dondé que encontrava tua fé,

Não sabes qual gosto é,

O sol em meio dia,

Causava-o tirania.

Pés em bolhas ensanguentadas,

Olhos castanhos desesperados,

Mãos fechadas,

Lábios descarnados,

Pernas doloridas,

Esperanças desaparecidas.

Até que o deserto fechou o véu,

Fez desaparecer o sol do céu,

Aliviou-se da calor se ir,

Mas não sabia o que estava por vir.

Veio a lua pálida em seu esplendor,

Com ar gélido acompanhado ao horror,

Pois não existe solidão maior e desesperador,

Que o deserto frio sem seu senhor.

As mãos no braços procurando chama,

Os dentes batendo por qualquer ardência,

Não conseguia andar sem tremer,

Não conseguia viver sem temer.

Tudo por causa de flores do jardim,

Ele pensou ter encontrado seu fim,

Mas no momento que conseguiu se desculpar,

Uma luz veio lhe visitar.

Essa luz rodopiou em sua alma,

O menino se acalmava,

Não sabia quantos anos estava na solidão,

Só precisava daquela luz segurar a sua mão.

O tempo passa,

A ampulheta engrena,

Voltou de seus olhos coloração castanha,

Era mais uma eterna noite serena.

As mãos calejadas por segurar forte o instrumento de poda,

O próprio perdão foi equiparado a descoberta igual a roda,

Preso em areia de ampulheta,

Conseguiu ao longe ouvir o ecoar de uma trombeta.

Ele já ouvira esse som anteriormente,

Pois o que é bom sempre fica cravado na mente,

Todo esfarrapado parecendo um servente,

Com o coração apertado parecendo haver uma serpente.

Chegava com a mão arrastando gadanho,

Sentia-se estranho,

Cheiro de cobre e estanho,

Por causa de quem lhe esperava no esquecimento.

O senhor esperava-o de mãos abertas,

Enquanto o deserto sugava o sangue dos seus pés,

Mesmo com dúvidas incertas,

Sabia que sentiria a água de marés.

Despejou de joelhos em frente a Jesus,

Sentia em suas mãos os pregos da cruz,

Seus pés em músculos não se comparavam as cicatrizes de cada mão,

Ao invés de reclamar da sua prova apenas pedira perdão.

Apoiando-se a foice nem conseguia ficar ereto,

Pois seu corpo não estava preparado para o certo,

Tinha vergonha de perceber o quanto fora desaforado,

Mas o rosto do senhor com ele nunca havia mudado.

Depois de tanta ironia,

De tanta desarmonia,

De qualquer vingança alucinada,

Pegava-o pelo semblante para continuar sua jornada.

“Por favor, me solte meu rei”

“Sei o tanto de problema lhe causei”

“O quanto lhe aborreci”

“O quanto lhe esqueci”

“O quanto fez disso eu sei”

“Porém em nenhum momento eu lhe abandonei”

Duas frases de voz sem cansaços,

Fez sua alma em mil pedaços.

Uma mão voltava-se ao peito,

E debaixo da camisa, no seu leito,

Tinham raízes negras crescendo em mariposas,

Enquanto eram rodeados de raposas.

O menino foi maculado em seu coração,

Após rasgar os punhos em oração,

Queria tanto cair no chão,

Mas Ele não o deixaria em vão.

Então caminhavam por todo o mundo,

Tirando vinha por vinha do esboço imundo,

Apoiado nos ombros do senhor,

Retornou para o primeiro amor.

Não parava de chorar,

Jesus sempre alegrado,

Tinha vergonha de lhe decepcionar,

O mestre o mantendo motivado.

Tinha tanta tristeza por ter ido,

Achou que não seria novamente recebido,

Pensou ter sido esquecido,

Somente por ter medo de se admitir.

O menino é finito,

O deserto é infinito,

Mas ninguém disse que não há felicidade,

Pois todo o seu amor é de verdade.

Anos se passaram e pisou no primeiro pedaço de terra,

Começando para ele uma nova era,

Achou para si uma primeira rosa,

Ficando pela primeira vez todo prosa.

Ele, consigo ainda estava,

Nunca lhe abandonara,

Começou uma casa,

Uma fogueira de chama em brasa.

A rosa mais bonita de toda sua vida,

Que lhe fazia de alma revivida,

Morreu diversas vezes para poder ser quem é atualmente,

Mesmo sofrendo constantemente.

Regava a rosa com lágrimas de adoração,

A protegia como se fosse seu novo coração,

Pois foi o presente mais importante para sua existência,

Que até hoje ele pede por clemência.

Todo o caminho fora conduzido por todo deserto,

E de certo,

Desta união,

Veio a ti a comunhão.

Mesmo com as raposas cheirando a pão,

Nunca olhara para trás,

Pois preferia a unção,

Do que olhar para quem o pão faz.

Mesmo irado,

Mesmo amargurado,

Nunca quis se esconder da realidade,

Pois só existe o Senhor da Verdade.

Confiou e não desistiu mesmo na beira,

Colhendo o que semeia,

Depois de anos o filho se senta na mesa da Ceia,

Porque nenhuma esperança se perde na areia.

Foi por amor.

Amém.

Corvo Cerúleo
Enviado por Corvo Cerúleo em 18/06/2019
Código do texto: T6675868
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