Não creia

Não creia que em mim

broteja tanto fel.

Afinal, sempre afinal,

o amor é sempre um mel.

Os versos,muitas vezes, exprimem

a revolta que se vê em outrem,

sofrimentos chorados com o vento

e que apenas no peito se comprimem.

Não canto a minha dor.

Em mim ela encontra compreensão.

Minhas toadas choram o calor

da dor que sinto no olhar dos outros,

que introvertidos não conseguem expor

os bafejos íntimos com ardor,

e soluçam atormentados em conflitos,

tentando, em vão, gritar o seu temor.

Eu canto a solidão do amigo ou irmão

que esconde no peito uma paixão.

Eu choro o choro triste, sem perdão,

de quem se amargura na solidão.

Eu sinto na boca amarga da verdade

a dor sofrida da saudade

de quem se foi e não voltará jamais.

Assim, passo a passo, tento expressar

a dor de quem sofre sem chorar,

e tento, ao menos, ajudar,

e ressuscitar a paz no peito, sem pesar.

No fundo, eu sempre estou de bem com o mundo,

não é uma catarse do meu próprio eu.

É sentir uma dor que não gemeu,

os gemidos que ouviu e compadeceu,

e que expressa que compreendeu.

Sinto o farfalhar do vento nas palmeiras,

os sussurros de amor, a vida inteira

e as arruaças tão fagueiras

da vida por si só.

Às vezes, em minha garganta surge um nó,

mas tento transformá-lo em pó

e soprá-lo, fortemente, ao vento, só,

para que, no raiar da aurora,

a dor já tenha ido embora

e restar, apenas, a esperança.

Nadir de Andrade
Enviado por Nadir de Andrade em 20/03/2008
Código do texto: T909510