Somente hoje, para sempre
“Somente hoje, para sempre...”
O estribilho ecoava na sala virginal.
Aparentava uma morte inacabada.
Mazelado em gestos e trapos,
Desconheciam-se origens e orações
Em que seu ventre recebeu origens.
Seus olhos azuis, revirados,
Indicavam sapiência turva
Do que lhe circundava o presente.
O passado era seu destino, seu leito,
Suas tetas férteis.
Excrementos imprimiam surrealismos
Em suas vestes.
Tinha o corpo irritado e alma movediça.
Seu olhar translúcido, seus gestos divagos,
Tudo transgredia à fuga, abandono.
Olhava ocultando o visto.
Estrangeiro naquele tempo,
Naquele espaço, naquela vida teimosamente prática;
Estava dormindo à espera do passado.
Tinha um pedaço de sonho e um refrão:
“Somente hoje, para sempre...”
Uma dor no gesto e sangue coagulado:
“Somente hoje, para sempre...”
Pião de madeira, mamadeira, mamãe:
“Somente hoje, para sempre...”
Estupro, luzes apagadas, ameaça:
“Somente hoje, para sempre...”
Fundo, cada vez mais fundo, solidão:
“Somente hoje, para sempre...”
A dose Rohypnol não foi necessária.