BLUES PARA UMA MADRUGADA SEM AMANHÃ
Minha alma canta um blues desafinado,
um gole de uísque, um trago de insônia,
e a lua, velha cafetina do tempo,
sorri como quem já viu tudo e não avisa.
A infância? Um postal desbotado,
uma pipa rasgada no fio do esquecimento.
O menino que fui já nem me escreve,
e o velho que sou falsifica a juventude
com cremes, promessas e trocados.
A vida me contou uma piada sem graça,
mas já era tarde pra pedir o dinheiro de volta.
O amor? Um bar fechado às três da manhã,
o aviso de “volto já” mofando na porta.
No mercado negro dos sonhos vencidos,
aceitam-se almas em prestações.
E o mundo? Ah, o mundo já passou do prazo,
mas eu finjo que não vi
e peço mais uma dose.