Eu sou da mata

Ah aquele cheiro de mato!

Aqueles raios de sol perpassando a copa das árvores

Que mais pareciam frestas de telhas de casa

Só que de uma beleza impenetrável 

Ah aquele som de vida

Que me fazia ter a certeza

De que eu estava no lugar certo

Fazendo a coisa certa

Aquela leveza na alma

Que me fazia sentir que eu era parte de tudo aquilo

Eu sou tudo aquilo ainda

Por vezes eu parava tudo o que estava fazendo

Só pra olhar aquele céu limpo

E os zilhões de estrelas que brilhavam lá

Por vezes eu parava para ouvir

O som dos pássaros, a noite

Junto a um friozinho

Que me arrepiava por dentro

O barulhinho da água escorrendo

De longe ou de perto

Seguindo seu curso

Os olhos brilhantes

Que surgiam, por vezes, em meio ao breu

E me paralisava

Por vezes eu tirava as botas

Só para sentir os pés na terra

E porque as botas já estavam cheias de água

Deixando meus pés enrugados

Por vezes sussurrávamos

Para não assustar algum animal

Ou para não assustar algum caçador desconhecido

Que passava por ali

Ah! haviam também tantas pessoas

Daquelas com sorrisos simples

Sempre prontas a ajudar

Com tanta ternura no olhar

Mesmo tendo pouco

Seria o bastante

Para nunca deixar de dividir

Com os forasteiros desconhecidos

Os sapos coaxavam todos os dias

Ainda ouço as Dendropsophus minutus gritando

Tagarelas como se estivessem numa festa de rua

Ainda sinto vontade de dar um beijinho protetor

Em um Pleurodema diplolister

Se encontro com aqueles olhinhos pidões

Muita coisa muda na vida da gente

Muita coisa transforma e transborda

Mas certas coisas

Aquelas que enchem nosso coração de paz

Ainda estão lá, sempre estarão lá

Porque fazem parte de nós

Eu sou a árvore 

Eu sou a terra

Eu sou aquele rio, seguindo adiante

Eu sou os bichos da mata

Que podem gritar livres diante das estrelas

Eu sou também cada uma das estrelas

Sou a alvorada

Sou cada semente que brotar ali

Eu sou toda a vida,

Toda a mata,

Ela está em mim e eu estou nela,

Eu sou ela, eu sou ela.