MINHA RUA

Do meu quarto, deitado, olho obliquamente, para a rua, que se abre a frente dos meus olhos.

Na minha rua, há um quadro de pessoas passando!

Na minha rua, todas as pessoas nunca vem, apenas se vão!

Há um quadro em minha rua de crianças, moças, meninos, uma mulher adulta e algumas pessoas velhas. Todos eles caminham na minha rua!

Eu observo a trupe, languidamente, como se observasse um por de sol que sabemos que vai acabar e por isso nos tornamos melancólicos e tristes, quando o presenciamos.

Minha rua tem uma peculiaridade. Nela é como se tempo não passasse para mim, mas só para os outros.

Eles andam na minha rua, mas, estranhamente, não se movem do lugar. Não saem do meu campo de visão, pelo menos enquanto os observo. Minha rua é como uma grande esteira a andar no sentido contrário deles.

Quando mudo de posição pelo desconforto das costas, vejo que alguns já não estão mais lá.

Das três pessoas velhas, duas saem de cena. Me distraio por uns instantes e a paisagem se altera novamente. As crianças estão maiores, ainda correm para frente e para traz. Alguém lhes afaga os cabelos esvoaçantes. Mostram-lhes algo que tem às mãos.

Penso que minha rua é eterna, mas, de repente, alguém toca a campainha. Levanto-me para atender à porta.

Quando volto para meu silencio, não vejo mais as crianças, apenas adultos seguem caminhando! Três no total. Somente três!

Tenho sono, ajeito o travesseiro, tento dormir, passo um tempo largo com a cabeça pesada, sem conseguir dormir.

Volto então, meus olhos para o painel da minha rua e já não vejo ninguém nela.

Apenas flores amarelas da última primavera, esmagadas pela gravidade dos pés. Elas ainda perambulam nas mãos de uma brisa caborteira e fugaz!

Mas não me passa desapercebida. Eu a vejo, nitidamente, balançando as folhas das árvores. Na minha rua, nada escapa dos meus olhos. Vejo tudo que passa. Não fosse a fraqueza da minha visão, veria bem mais coisas. Quantos coisas não deixo de ver, por falta de acuidade? Minha rua, certamente seria bem mais atraente se pudesse ver todos os seus detalhes.

Será que alguém está me vendo a passar na minha rua? Será que alguém me vê neste momento, com seu olhar obliquo, olhando-me a pisar nas flores amarelas? Quanto tempo mais permanecerei no seu campo de visão? Quando minha rua voltará a ficar deserta?

Quando isto acontecer, a enorme boca de caverna escura, que se desenha no seu final, formada pelas árvores que descem quase até o chão, causará também angústia e vazio neste alguém que me olha, como causa em mim? Quando minha rua, será a rua de alguém e não mais a minha rua?

Celio Govedice
Enviado por Celio Govedice em 25/10/2020
Reeditado em 26/10/2020
Código do texto: T7096106
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