O resignado
Parte 1
A sensação de não pertencimento a esta Terra
Lança em meu ser as suas profundas raízes
Procurando a essência desconhecida que se encerra
No âmago profundo e, rasgando a alma, deixa cicatrizes.
À medida que alma adentro as raízes descem
Estampa-se na face a dor do choque com a realidade
Em virtude das forças vitais que se enfraquecem
Como que de volta sugadas à esperada eternidade.
Lágrimas então escorrem, mas sequer lavam a alma
E às raízes que se alastram servem de alimento.
E, à força, contenho-as, antes que pior se torne o trauma
De estar onde se semeia paz, mas se colhe o tormento.
Assim, prestes a matar a esperança, que frágil mantém a vida,
Ouço: – Resigna-te! Foi o que escolheste antes de tua partida.
Parte 2
Recolho-me, portanto, à minha humana ignorância
Porque das nossas escolhas somos produto.
No entanto, resignar-se não é desistir diante da Inconstância.
É, sim, guardar forças para lapidar o diamante bruto.
Diamante esse que encontramos diariamente no espelho
Quando em raros momentos de calma e lucidez
Permitimo-nos estar livres do cotidiano relho
Com que nos chicoteamos tal qual a revoltada rês.
E ainda que me persiga aquela mesma estranha sensação
E que a cada dia ela se transforme em certeza,
É aqui que estou e é aqui que se dá a luta pela redenção.
Assim, resignado, ouço, agora para minha não surpresa,
A mesma voz que para a realidade me desperta:
– Filho, sempre que voltares encontrarás a porta aberta.
Cícero – 13-11-15