Todas as vidas que eu vivi

Tantas pessoas eu fui,

tantos alter-égos díspares,

tantos contrastes em minha unicidade,

faces ocultas de um território lunar,

quantas vezes escondi meu rosto,

para encobrir minhas cicatrizes,

usando máscaras de outrém,

encenando os dramas de mim mesmo,

naufragando em minhas próprias correntezas,

enquanto os dias tornavam-se noite,

tantos sentimentos vivi,

tantas lágrimas perdidas,

tantos sorrisos trocados,

em cada música uma história,

em cada estrada uma encruzilhada,

em cada manhã uma notícia de jornal,

olhando pela janela do trem,

vendo as paisagens passarem tão rápido,

enquanto os fios da minha barba embranqueciam,

dos 20 aos 38 uma nova perspectiva,

vendo o mundo através de laboratórios,

buscando entender minha psiquê interna,

meus devaneios e delírios de solitário,

meus medos e sonhos de andarilho,

nômade na alma e no coração,

um amor em cada nova estação,

dedilhando notas novas no velho violão,

melodias e poesias legadas ao vento do devir,

tentando novas chaves para abrir outras portas,

cansado da escuridão desse longo corredor,

entalhando meu nome na madeira do batente,

fechando-me sob o capuz do moleton,

escrevendo palavras de redenção,

ensaiando pedidos silenciosos de perdão,

mantendo minha insônia para propósitos nobres,

embalando à distância sonos que jurei proteger,

sendo o cavalheiro que o canalha me tolheu nos finais,

pontos de reticências de trajetórias mal resolvidas,

âncoras fincadas em um porto desconhecido,

para sentir bem fundo a dor dos humanos,

aquela destinada às culpas de um anjo caído,

sobrevivendo às hecatombes nucleares de cada ciclo...