Sempre morreremos!
São as horas da noite que nunca descansam.
Ainda tu estás como sempre te vimos,
Sem tirar o teu gesto corriqueiro!
Ainda és apenas um entre bilhões,
Que esperam e ficam sempre alheios.
Ainda não podemos te elevar à fria luz da lembrança,
Ainda não podemos tocar o ido sem uma lágrima,
Nem uni-lo ao futuro já dentro do instante passado
Onde teu ser ocupará o teu lugar em algum retrato.
Ainda podemos tocar-te com estas mãos,
Feitas de carne, ternura e perdão.
Ainda és descoberta e movimento
Ainda és um não viver vivendo,
Mas em breve todos nós teremos partido,
E nas ruas as luzes dos postes estarão acesas.
Morremos frágeis como as flores morrem,
Mas não há consolação nesta morte intensa,
Pois dói no sangue o veneno das horas tensas,
E morreremos no chão, individualmente,
Como a terra explorada incansavelmente.
Quando o sereno da noite escorregar nas vidraças,
Faleceremos como as águas tristes e caladas
Ou como as folhas secas pisoteadas pelos sapatos.
Também morremos altos como as montanhas solitárias,
Sozinhos como a luz sobre todos esses mares infaustos,
Como o amor sempre atento ao desejo do vento.
E morremos infelizmente, sempre morreremos “amados”,
Como os objetos sem alma que nos olham calados,
Os objetos desejados e gastos pelo uso e esquecimento,
As formas de se viver endurecidas em nosso cotidiano,
Os abraços que se alargam e depois se perdem pelos cantos.
Enfim, tudo o que é secreto como a dor reprimida
E que também certamente morrerá um dia,
Morrerá de morte tão torpe e definitiva
Quanto a que morremos em todas as horas não vividas!
"O coração do sábio está na casa onde há luto, mas o dos tolos, na casa da alegria."(Eclesiastes 7:4)