Subsolo
Parece que carrego
todas as dores do mundo.
Vazios e excessos
que não consigo decifrar,
tampouco preenchê-los ou arrancá-los.
Me desatento,
como folha que dança ao vento
enquanto pragas a condenam.
Olho para cima, mas estou retida
entre os galhos do tempo.
Procuro a trégua da espera
ouvir dizer que ela enxerga
além das frestas
da densa floresta.
Há forças sutis nas raízes.
O subsolo suga a superfície,
nutre-se, entrega o que resta
e, às vezes, nega-se a curar.
E, por eu adoecê-las,
elas escolhem me cortar.
Cair não tira marcas.
Despedaço ao toque das águas,
ou torno-me seca
pelo calor da presença alheia.
Sobra vazada envenena;
é carinho suave
que golpeia.
Componho o amontoado,
das folhas jogadas ao alto
pelas mãos do menino.
Pedaços pisados,
entre os que já foram inteiros —
brinquedos do destino.
Posso sentir o que não tenho,
pois um dia tive.
Tenho o que não quero,
porque cavaram e jogaram
o que eu nunca quis.
Sou o que fizeram de mim,
não o que nasci para ser.
Meus frutos, onde estão?
O aroma não exalei,
a beleza não revelei,
o sabor doce não produzi,
apenas... vi.
De tanto olhar
pra onde a natureza parecia perfeita
não percebi
quando me perdi
e deixei de fazer parte da árvore —
ou ela deixou de fazer parte de mim?
Ig: @ondas.depalavras