A parte que falta

no início era cogitação
até eu ouvir seu coração
batendo perto do meu ouvido
forte e decidido
porque se a voz falhasse
os demais sentidos
estariam obrigados a fazer sua parte
eles não faltam com a verdade
nem eu altamente inspirada
criaria um enredo tão envolvente
e comigo mesma seria indulgente
inapta a captar os sinais
te julgava sob o meu olhar
e quem disse, meu caro,
que não sigo fazendo isso
ao proclamar sentenças
cujo conteúdo desconheço?
minimalista nas palavras
para não banalizar o sentir
e calar o que deveria verbalizar
para desafogar a dor
e sentir a leveza
proveniente da franqueza
a introversão pode doer
quando seu mundo colide
com outro intenso no ser
apesar de introvertido
a porta entreaberta
e todos os demais sinais
para você fazer morada
seguindo também calada
deixei dúvidas sobre o sim
quando era com certeza
eu nunca serei você
apenas especulo o “e se”
porque me restou isso
o tal do nunca saber
se seríamos dois em um
ou cada um no seu canto
de seu ponto de vista
ser a parte que falta
para a história acabar
eu já virei a página
tantas e tantas vezes
falando sempre o mesmo
a tinta da caneta acabou
o ano já virou cinco vezes
o relógio quebrado
me prendeu àquele dia
ao último beijo
que não sinalizou sê-lo
ao primeiro e único café
em que fui deveras mulher
um brinde ao nunca mais
seguir em frente
fácil para quem fala
difícil para quem cala
e solta o barbante puído
porque já perdeu a esperança
de conhecer a verdade
caminhando lentamente
cabisbaixa e descrente
não houve ninguém por aqui
a estrada segue vazia
desde que você se foi
com a melhor parte de mim
dizem que não
que ela segue comigo
firme e forte
eu já não garanto
acredito que não é para tanto
e você segue em pedaços
você se busca por aí
ou já se refez há muito tempo?
cinco anos é tempo demais
para não permitir o amor entrar
até no universo mais introvertido
onde o toque é permitido
se curar a alma machucada
perdoar é bonito
eu não tinha essa dimensão
mas talvez você precise
que eu enxergue o seu lado
e encerre por aqui
um ciclo repleto de achismos
para me conscientizar
de que essa raiva toda
me mantém presa a você
e queira me dizer algo
que o orgulho nega
tampando os ouvidos
eu não posso falar por você
minha lucidez confia
na sua bondade
e as emoções me traem
porque para superar você
preciso te deixar ir
e como posso fazê-lo
se sempre que me lembro
ainda sinto semelhante dor
repito a você
que ainda estou presa
dentro de um relógio quebrado
se você for capaz de me ouvir
venha e me socorra
eu levanto a bandeira branca
sinalizando a minha rendição
se você tivesse outra escolha
se o se não fosse se
essa poesia existiria?

 
Marisol Luz (Mary)
Enviado por Marisol Luz (Mary) em 10/04/2020
Reeditado em 10/04/2020
Código do texto: T6913091
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2020. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.