assimilação

Esqueço-me de tudo

Mas nada me esquece.

Esqueço nomes, lugares, caminhos, trechos.

(Surpreendo-me dos que os citam

Frescos, viçosos, completos –

Não sou para citações:

Não posso querer ostentar lembranças.

Não mais.

Distorço-as, corrompo-as).

Nunca assimilei datas: minha cronologia é o caos

(Meus fatos se misturam devassos no tempo).

Esqueço o que fui fazer.

Esqueço o que vim dizer.

Esqueço-me do que falei, se falei...

Mas todos os personagens que li vivem em mim.

Todos os lugares a que fui – todos – passeiam-me.

Os manuais que aprendi regem algo de mim.

As gramáticas que assimilei de alguma forma cumpro

(As crases, as próclises, as regências e concordâncias todas.

Só não me peçam que explique).

As casas em que morei me habitam. Os quartos de hotel, até.

As peles que senti, as vozes, os cheiros, os tons

Tocam-me ainda.

E o que não ficou não me era.

Ao que não ficou nunca fui.

Não apreendo o que não sou.

Mas o que sou e vem todo me amplia.