Os sonhos são condicionados ao tempo de sono

Quem nunca provou da liberdade,

não sente saudades dela,

assim como aquela panela que nunca cozinhou nada,

não guarda o cheiro de tempero algum.

Já para quem nasceu livre...

Fico imaginando no que pensavam os jovens,

do velho continente negro, na paz e relativo sossego,

nos prováveis montes, próximos ao litoral,

sobre o que poderia haver para além daquela imensidão,

de água, maresia e sal.

E ainda nem sabiam de Cabral

e nem do novo mundo, tão imundo quanto

as covas dos leões.

Mas foram lá busca-los, as novas civilizações,

e o que viram, os trazidos não gostaram,

novos amores não encontraram

e também não atravessaram

em navios de primeira classe

e nem com a brisa comum nos conveses.

Não foram convidados,

foram sim, escravizados e forçados ao trabalho,

sem direito a queijos e beijos,

que até o cão do sinhô recebia.

E como a rebeldia? Eram muitas as etnias

e do que pensavam lá em suas pradarias,

só restaram os hábitos e manias negras,

o que hoje, hipocritamente chamam,

de herança afro.

Afrouxa esse laço, moço.

Aquela criança cresceu acorrentada

e nem sequer foi batizada,

pois o padre também era um escravo,

só não era açoitado,

mas tinha por obrigação,

apresentar-lhes um novo deus,

como aquele que também ensinou aos hebreus,

a atravessar o mar.

Mas Deus não teve nada a ver com isso.

O lamento nagô, a resistência xangô,

os encontros na dor e muitas saudades,

mas...de que?

Viver sem o mínimo para viver,

não é viver e nem escravidão alguma foi abolida.

Abolida foi a nossa vida

e ainda hoje vejo juntos,

o sinhozinho, o pelourinho e o feitor,

ou reitor.

Sistema de cotas, não repara nada,

a indústria de sonhos é limitada

e as vagas para os injustiçados,

funcionam como uma distribuição limitada de senhas,

para que se cadastrem como cidadãos.

Queiram ou não,

não só a laje é de isopor.

Nessas imensas pradarias,

quem um dia não sonhou?

O conceito de minoria,

vem de consertos mal feitos

e quem tentou consertar não permitiu a educação

e nem o acesso a saúde.

Deus que nos ajude!(?)

É bem maior o número de injustiçados,

flagelados, pobres e favelados,

mas para assustar uma manada de antílopes,

basta apenas a presença de um leão

e para o controle de pragas,

bastaria apenas a boa intenção

e se não for pedir muito,

um pouquinho só de amor no coração.

E para onde irão ou para onde iremos,

depois de atravessado esse marzão

e perceber que o novo mundo,

não era nada disso, não?

A capoeira e o balé,

o salão e a senzala

e isso é só apenas um pouco de poder

nas mãos.

O pajé, o doutor, o caboclo,

o padre, o pastor

e no meio da queimada, um toco.

Quem terá a cura para essa nossa dor?