Alma Indígena
 
Eis que a besta debruça as ancas pelo ar
E atraca os braços finos e rígidos do remar
Sobre esta terra tropical sereno lar
E toca a praia impisada por invasor de mar.

Desconheço a armadura que tu vestes
As armas e a bandeira que te proteges
Nem as vergonhas do teu corpo aparece
Como suportas o calor que entranha e aquece.

Em tuas mãos o que reflete me entontece
Vejo minha face como no rio que amanhece
Sem nervuras e embaçados que empobrecem
A beleza da pintura, a cor de minha pele.

Traz-me coisas nunca vistas, de encantar
Tecidos feitos, pente fino e belo colar
A Cruz de Portugal: a culinária, o paladar
A Cruz de Cristo: o catecismo para me salvar.

Eis que tudo é uma troca ilusória
Corrompe toda tribo, nossa oratória
Ofusca-me a alma,  os valores, as histórias
Não escraviza, aprisiona nossa glória.

Leva-me o ouro pelo desgosto desta vida
Despe-me as matas, retira-me a prata fina
Não há mais tribos, nem pajé que viva
Não sou mais índio, sou eu, quem fica.


 

 
Débora Muniz
Enviado por Débora Muniz em 17/10/2019
Código do texto: T6771733
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