O Livro do Coração

O LIVRO DO CORAÇÃO

Este livro envelhecido

tem marcas que eu mesmo fiz...

E a própria vida hoje quis

dar conta do que guardei.

Nos rastros que já cruzei

e o tanto que hei de andar,

percebi que, ao versejar,

confesso tudo que sei.

O abraço - quando guarida -

mostra no gesto, a clareza...

Razão inversa à vileza

de quem esconde consigo

armadilhas neste abrigo,

expondo (em falsa proposta)

que a mão que afaga as costas

jamais oferta perigo.

O espinho carrega a culpa

de ferir a quem afaga

- casca seca e vida amarga -

...Seu destino não foi pleno!

Teve a bênção do sereno

na vivência que lhe cabe;

E apenas ele é quem sabe

que a flor também tem veneno.

A solidão é poesia

escrita em verso calado...

Logo ao tê-la no costado

se deixa de ser sozinho!

E assim, revela aos pouquinhos:

- Paciência não é cansaço!

...Pois, bem pouco adianta o passo

se for maior que o caminho.

A confiança, se perdida,

talvez não ache retorno...

Na ferida do abandono

descobre quem lhe merece.

Ao seu jeito, reconhece

que diante à palavra errada,

bem mais vale dizer nada...

...num silêncio – quase prece.

O perdão é cura entregue

à quem se aceita aprendiz

do ensino que a cicatriz

demonstra em paciência e dor...

...Pois a fé só tem valor

na reza de quem bem sabe

que pouco adianta o milagre

se o santo for pecador!

O sonho, embora buscado,

nasce e morre junto a nós...

Será inverdade no "após"

se não lhe cuida o "presente".

E teima em contar à gente

sobre distância e saudade,

se acaso a felicidade

toma um rumo diferente.

O tempo leva consigo

- nas rugas simples da idade -

a real capacidade

de que ele mesmo conserve

aquilo que a história escreve

e se transforma em lição...

...pra o livro do coração

guardar somente o que deve.

O olhar - guardião da face -

conforme este livro ensina,

carrega a eterna sina

de ser sinal da verdade...

E deflagra, sem piedade,

alguém que, com dita ira,

pensa que a voz da mentira

calará a sinceridade.

Todo livro, embora antigo,

traz consigo uma lição...

Este, do meu coração,

também não é diferente,

Em suas linhas, sabe e sente

tudo que mais nos indaga...

...e entende as dores amargas

que, por "vez", invadem a gente.

Suas páginas são um segredo,

por nunca encontrarem fim...

Contam do não e do sim,

do final e do começo.

- Eu, que tanto lhe conheço,

guardo-o na estante da alma...

Não o decifro sem calma,

tampouco o leio ao avesso.

Desta forma - folha a folha -

descubro aquilo que sou...

E se o tempo assim guiou,

me confesso por inteiro

neste livro, companheiro

das horas que, sem aviso,

a saudade que escravizo

faz de mim, um prisioneiro!