GARIMPOS

na tênue superfície do cotidiano

fragmentos banais se revelam:

o copo quebrado que numa noite profunda

matou a sede do velho pescador

cartas que um dia pediram notícias

ou que apenas trouxeram a saudade de quem

há muito partira

o sorriso da jovem em seu vestido branco

de primeira comunhão

o espelho da toalete onde anos a fio o pai

viu-se endireitando a gravata antes de sair

para o trabalho

assim caminhamos pela vida

a bordo de naus cegas em pleno nevoeiro

gravando no mundo nossas cicatrizes

e quando não mais vagarem pelas ruas

as sombras errantes dos nossos feitos

e de nós se esquecerem todos os adeuses

surgirá alguém a vasculhar

por entre as fendas congeladas do passado

o cemitério de antigas lembranças

* * *

Goiânia, maio 2008

Glauber Ramos
Enviado por Glauber Ramos em 07/06/2008
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