QUANDO O GOZO CALA

Queria tanto tua voz

dançando entre palavras

nas modulações de um bolero

das frases silenciosas do quarto.

Dormi em meio a segredos

enquanto seus olhos, sem sono,

descobriram meus lençóis da fadiga

e excitaram todas as serpentes

com dentes, língua e gânglios

para que tua bunda recostasse

aberta falando para as coxas

o infinito segredo inacabado.

Queria tanto tua tez

por baixo da minha mudez

devorando minha nudez sensata

sem frases chavões ou premeditadas.

O travesseiro mordido de dia

guarda tua saliva escorrida solta

descobrindo os anseios da lua branca

a rasgar a janela, as pregas, a fardo

do desejo de ter no imprevisível

o fato do gozo sem procriação

mais íntimo, tanta alucinação

devassada lua consumida.

Queria tanto reviver

outra vez sua voz de pecado,

matar o quarto em que nos comíamos

na falta de alimento, de carinho ou d’água

quando o amor dormiu, por nós envenenado,

fez-se a felicidade de permanecermos calados

aos barulhos dos corredores que cortam os quartos

do silencio conquistado quando descansa o amor quieto.