... E ELE NÃO GOZOU DE AMOR
Julião, apressado,
virou de lado e dormiu.
Por mais que a festa feita
com a minha boca, sem fala;
por mais que a voz, e luminárias
em festa para o corpo acostumado
sustentasse minha voz descarada
nas tonturas que a cama dá,
tentasse justificar calada
o ejacular fora desta trama
sem o tal amor irônico e crônico.
Aos dez anos de casada
não pude me separar da insônia.
Mas, ao primeiro dia de décimo primeiro,
percebi tanta falta de coberta e de entusiasmo,
que passei a vestir o sono com as sobras do meu corpo.
Julião de pernas grossas,
as mesmas que andaram até nosso casamento.
Julião pelado, nu em sensibilidade,
o mesmo que me fez apaixonada.
Agora vira para o lado, como máquina,
e, morto de namoro, noivado e casamento,
desacostumado com a rosa do café da manhã,
deixa escapar em dez minutos meus de pensamento
cortados pela Juliana, nossa filha, que diminui minha noite
e que, fatalmente pedirá, para bem cedo ir à escola com o pai.
Julião de peito inconveniente
agora ressona e incomoda estridente.
Tenho vontade de telefonar para a mãe
e contar histórias de dez anos aprisionada.
Mas tenho medo da descompostura das alianças
que insiste ficar no dedo, apesar do sabão molhado
que pede para lavar a alma dessa mulher de nove anos
imprópria de perceber que o dia masculino está em sua volta.
Juliana, nossa filha, acorda. E, rouca, pede carona ao pai sem gozo.