Solidão
SOLIDÃO
Solidão,
lago secreto da vida
onde me banho hora a hora
num silêncio matizado
de vozes e sorrisos...
Solidão,
minha pátria
eco de um visionário
que de mim se fez gémeo
e de quem sofro também
a dor e o pranto.
Solidão,
vazio e presença
murmúrios e cantos
vozes e gritos,
solidão embrenhada em cada segundo
tecida no ventre de cada madrugada
sofrida na luz de todo o entardecer...
Solidão,
gémea de mim:
porque hei-de trair-te
se és tudo o que tenho
porque hei-de iludir-me
com vozes e corpos
com carícias e beijos
que vêm e que vão?
Solidão,
afinal, és tu que me ficas
és tu que me encostas
o teu corpo inefável
e os beijos que à noite
o vento sussurra
são teus, solidão
e é teu o abraço
que me cinge no sonho
quando largo o oceano
que transporto comigo.
Solidão,
escuta:
ser-te-ei fiel
cortarei amarras
arrancarei correntes
não deixarei entrar
nenhum sopro
nenhum hálito
nenhuma mão
virá afagar o tecido
que tenho encrespado
pelo toque de ti...
Solidão,
desce aqui!
Vem deitar-te comigo
nas margens do rio
adormeçamos juntas
de mãos enlaçadas
até que a noite prossiga a viagem
e as estrelas murchem
na luz da alvorada!