ANO VINTE E SEIS
Sou anos oitenta,
Século vinte.
Ano vinte e seis.
Sou a melindrosa pra versinhos. Escrevo romântico.
Crônicas. Historinhas bobas de diário adolescente.
Um lugar-comum estúpido. Ignorante de silêncio.
Sou sábia complexada. Bruta sentimental.
Sou sempre a mesma coisa, em desenhos repetidos
Como trincas confusas na porcelana partida.
Sou fotografia envelhecida. Recortada.
Uma versão colorida do preto-e-branco. Do negativo.
Eu danço a música eletrônica da liberdade.
Meu coração é putz-putz. Dance. Trance. House.
Pop-rock. Clássica.
Age desacelerada para o ritmo perfeito.
Sou retrospectiva. Reeditada
Romance de novela reprisada.
Cada vez mais previsível. Fake.
Contorcendo-me em chavões hollywoodianos.
Sou Marilyn Monroe bêbada. Sua.
Engolida. Adaptada para locais pudicos.
Sou um cigarro que queima abandonado. A fumaça.
Uma matéria sólida desmanchando-se no ar.
O álcool. Estonteante. Ansiedade e êxtase.
Sou Sado. Fetiche. Masô. Suave. Lenta. Sonolenta.
Livre. Sou tudo que você não queria.
Livre. Sou tudo o que você mais quer.
Sou um sorriso desprendido.
A braveza mal disfarçada.
Uma propaganda que convence da boa-educação.
Sou uma embalagem bonita da subversão.
Um acerto do amor, que ama desordenado,
Na escolha do que se deixou ser por mim,
Incondicionalmente amado.
Sou anos oitenta,
Século vinte.
Ano vinte e seis.