BORRA DE ESCREVER
Disse-me
Um anjo da fala:
- o lucro da piração de escrever
Está em atar-se à lavra da palavra
Que de dia chama-se Maria
E de noite goza-se Amélia vadia
- está em ater-se à regra feminina
- está em vestir-se
(dentro da fala)
De vermelho e preto
- está em desvelar-se o orgasmo
Do ponto de arranque
Disse-me
Que o ato de escrever
- é como matar a cobra
E não mostrar o vencedor
- é como mostrar o pênis
E não sacrificar o receptor
- é como servir o servo
E não coar o seu suor
Disse-me ainda
Que a borra de escrever do poeta
- é como ser e não ser
Já sendo breve nascida
- é como beber poesia galhada
Que embora embaralhada
Não se cansa de escarrar
Fina bulimia
Mas vejo
Que os anjos da fala
Não vomitam seus lamentos
Como reza o figurino
Não escrevem seus pesares
Como ensina o pensamento
Tampouco galam seus suores
Na fomedez da partida